quinta-feira, 20 de novembro de 2025

HISTÓRIAS DO MEU POVO, Aduilson Gois

 

HISTÓRIAS DO MEU POVO, Aduilson Gois, Aracaju, Infographics, 2025, 166p, isbn 976-65-5730-263-7

 


Saiu a terceira obra do escritor (uma grata surpresa) Aduilson Gois, das Flechas de Itabaiana, meu primo segundo, que conheci outro dia, filho de Antão e neto de tio Homero.

Este meu tio Homero, como sua irmã Florita (que é minha mãe), sem prejuízo dos demais irmãos,  foram brilhantes na  arte de relembrar, incansáveis contadores de histórias. Os ouvintes viciados e boquiabertos sempre eram surpreendidos com inéditas e apaixonantes histórias.  

Aqui, Aduilson está atento ao povoado em volta, desviando o olhar de seu mundo de quase a vida toda, quando viveu perigosamente nas rotas do crime, nas arriscadas fugas, ou na solidão da cadeia.  “Cansei de Servir o Diabo” e  “A Liderança”,  suas obras anteriores publicadas, tratam com maestria dessa fase dura.    

O escritor mostra, agora, o lado lírico de sua alma. Aqui são 52 crônicas curtas, leves, escritas no tosco e saboroso linguajar dos povoados de Itabaiana.  Algumas nem uma  página dão, outras apenas registram uma pessoa ou um momento que precisam ser preservados, pois foram importantes para algum morador, para o  povoado, para os olhos de quem, fugazmente, agora, os vê.  

O livro trata de Antão (o pai do autor), de meu sósia Saracura, da parentada espalhada, dos vizinhos...

E trata do meu São Tupi, time de futebol com sede no campo de várzea ao lado da antiga bodega de tio Homero, onde o pau quebrava de verdade.  Eu era guri e, levado por tio Zé, fiz um teste em campo. Tio Homero era o cartola, o treinador, o avante e me recebeu receoso: “Aqui a parada é dura e você ainda é pequeno  e meio doentio”. E ele sabia muito bem que meu pai considerava futebol, ramo de preguiçoso, sem futuro nenhum. Mesmo assim, fiz teste rápido que não prosperou e está contado no romance “Os Tabaréus do Sítio Saracura”, capítulos:  Um domingo nas Flechas, e Os Livros de Cordel.

Aproveite e assista à partida de campeonato, que aconteceu naquele domingo, entre o time das Flechas e Os Paneleiros da periferia de Itabaiana.  Qual  foi o placar? Eu conto lá.

Há crônicas que dialogam comigo (ou com minha a obra), como as do  protagonista “genial” Saracura, homônimo que vi apenas uma vez e fiquei seu amigo. Foi em uma festa em homenagem ao casal tio Homero e Zefinha de Mengo, no terreiro do sitio dele... Havia muita gente do lugar, dos povoados em volta e até da rua. Tio Homero era um líder respeitado e querido.

Eu não perco uma festa dos ferreiros (Eitha povo festeiro!). Só não vou se estiver doente ou viajando pra longe.  

Alguém gritou meu nome (“Saracura!”). Eu corri em busca, serpenteado no meio do povaréu. O grito viera do pátio do templo evangélico (Igreja da bênção) construído no oitão da casa de tio Homero por um filho convertido, chamado Anselmo.

Chegamos ao mesmo tempo, querendo o mesmo pedaço de bolo e o  copo de coca cola. Então havia mais um Saracura (além de mim) no mundo, que tive muito prazer de conhecer.

Ninguém iria me chamar por um pedaço de bolo, mas não consegui deixar meu xará lanchar sozinho.  Fiquei seu amigo, se bem que nunca mais o encontrei na vida.

Algum tempo depois, o romancista Francisco Dantas mandou-me um recorte de algum jornal ou revista, parece-me que de São Paulo e que  falava de um Saracura, originário das Flechas em Itabaiana Sergipe, presepeiro, contador de casos engraçados, destaque no lugar onde morava o jornalista.  

E  Francisco  me gozava assim,  sugerindo que o Saracura fosse eu:  “Não há quem possa com este povo das Flechas de Itabaiana! Você faz  sucesso no Brasil todo!”

xxx

Retornando ao livro de Aduilson, destaco aqui três contos/crônicas, apenas para não citar o livro todo e também sugerir atrações especiais no turismo cultural de quem comprar a passagem.

“Antão e as cachorras vermelhas”,

“Homero comigo no dominó”,

“Gratidão”,

“Anselmo e a besta pampa”

“Histórias do Povo” dá para ler  de uma sentada sofregamente. Ou ser bebido como a um vinho de cem anos, um golinho hoje e outro amanhã, para melhor desfrutar.

O livro diverte, instrui e encanta. Pra que mais?

(Por Antônio FJ Saracura, em 18/11/2025).

quarta-feira, 12 de novembro de 2025

ECOS DO PASSADO, Hermenegildo Freire de Macedo

 

ECOS DO PASSADO, Hermenegildo Freire de Macedo, Artner, 2025, Aracaju, Se, 97 p, isbn 978-65-83131-55-3

 

O autor é professor desde menino e conta neste gostoso livrinho (ECOS DO PASSADO) de memórias como a vida o levou a tal, e a muito mais.       

Não havia o quinto ano no povoado Mangabeira e (acho que em nenhum outro povoado de Itabaiana) e o sonho de todo estudante era, ao caminhar para a conclusão do quarto ano, achar um jeito de ir estudar na cidade, no já lendário Murilo Braga. Mas a cidade, naquela época, era muito mais distante do que hoje (que tem boas estradas e transporte acessível) e poucos tinham a sorte de ter um tio Franquilino, que lhe desse pousada. E nem uma professora que não temesse a concorrência na profissão e que incentivasse os melhores alunos a serem professor também.

O autor é artesão nas horas vagas e é cozinheiro de mão cheia, artes aprendidas com os artistas do povoado e com a mãe prendada.

Hermenegildo é poeta de cordel (deve ser poeta de tudo o mais) e seus livrinhos de versos são didáticos divertidos, ensinam artes e modos de vida, alertam para os descaminhos. contam histórias do povo, resgatam lendas...

Agora ele é escritor-memorialista e nos brinda com um gostoso livro, que chamou “Ecos do Passado”, no qual revivi partes de minha infância, nas farinhadas, na lida da malhada, do curral das vacas de leite e em muitas coisas que as deixei passar em branco nos livros que escrevi... Como a matinha do candeal, que não há mais no sitio da Cajaíba mas ainda é preservada no sítio Saracura da Terra Vermelha. Como as solitárias Sambaíbas, Sucupiras, Paus Ferro. Deste Pau-Ferro, ainda hoje, tem quatro árvores solitárias (escaparam das coivaras do passado) em um uma capineira do sítio Saracura. Servem de sombra ao gado e para adoração do proprietário (Antônio de Dezi, personagem de destaque em toda a obra de Antônio FJ Saracura) e minha quando apareço por lá.

Transcrevo, baixo, trechos da boa narrativa de Hermenegildo sobre o candeal, que deve estar no subsconsciente de nossas raízes rurais, pois todos viemos das matas.

 “Naquela época, metade do sítio velho era coberta por vegetações nativas, e entre as espécies, as candeias predominavam. Era a salvação da minha mãe, pois de lá saía grande parte da lenha para o fogão de casa, já que na época nem sonhávamos em ter fogão a gás. Os candeais também forneciam garranchos para fazer fachos, usados na casa de farinha.

Era também lá o refúgio de centenas de pássaros de várias espécies que iam dormir durante a noite. Lá também era um ponto certo para fazer uma boa "faxinada" com estilingue. Durante o verão, eu gostava de ficar horas a fio deitado sobre as folhas frias, observando as copas fechadas das árvores e as espécies que por ali frequentavam.

Foi por essa ocasião que acabei descobrindo algo que não estava em meus planos. Os çandeais não eram frequentados somente por mim e os pássaros, tinha outros concorrentes... “

Quais seriam estes concorrentes?

Leia o bom livro de Hermenegildo Freire Macedo.

 

(Por Antonio FJ Saracura, em Aracaju, 2025nov12).