ARYCURANA, Constantino Souza, Unicamp, organizado pelo professor Moisés Santos Souza. Originalmente, o romance foi publicado no periódico Semana Ilustrada (1874-1875). Esta edição da Unicamp trata-se da primeira em 150 anos desde a publicação original em folhetins.
O jornalista José Afonso Nascimento postou no seu “facebook” em
18/02/2025: “Não é novidade nem exagero afirmar que Sergipe é terra de
esquecimento. Entretanto, isso não é absoluto. Várias forças lutam quase
sozinhas para jogar luz em pessoas e acontecimentos que foram apagados. É assim
que surge Constantino José Gomes de Souza, médico, poeta, romancista e
dramaturgo, nascido em Estância em 1825.”
“Constantino foi um escritor do romantismo brasileiro que conviveu e travou contatos com as mais destacadas figuras da época, como os romancistas Machado de Assis e Joaquim Manuel de Macedo, com o ator João Caetano e o tipógrafo Francisco de Paula Brito,” conta Moisés Santos Souza, professor da História da UFS em Lagarto, Sergipe, que tem trabalhado para recuperar Constantino e sua obra.
Eu baixei o PDF da Internet. Era para ler só um pouquinho, mas fui
até o final. Romance da época, ufanista, indianista, dramático, lírico,
nativista, previsível. Na mesma linha de outros da época como José de Alencar
(O Guarani, Iracema), seu contemporâneo. Muito bem escrito, ortografia atual,
usa muitas palavras e expressões em Guarani, que são explicadas nos rodapés das
páginas.
Narra a história de um amor impossível, tipo Romeu e Julieta (se bem
que, aqui, o final é meio feliz, apesar da trajetória até mais sofrida). Neste,
a filha do cacique Siriri, chamada Arycurana, prometida (foi criada junto) ao
primo, Jukeriorana, filho do cacique Seregipe (Serigy, acho).
apaixona-se por Borapitinga, filho do cacique
Muribeca, desafeto dos dois primeiros.
O cenário é a vida no lugar atualmente chamado Sergipe nos idos de 1590,
antes, durante e após a conquista, pelos portugueses de Cristóvão de Barros. Consta
que todas as tribos viviam em estado contínuo de guerra.
Eitha! povinho briguento!
Há colocações no romance que me causaram estranheza pois contradizem o
que sempre li nos livros da escola:
Que o motivo da invasão portuguesa foi apaziguar os índios que se
matavam em guerras contínuas. Que Cristóvão de Barros era mais evangelizador do
que conquistador militar. Que os índios sergipanos escolheram a guerra em vez
de uma paz proposta. E que, mesmo assim, Cristóvão, estando aqui, relutou,
negociou, adiou o ataque, pois era admirador do povo nativo. E que o cacique
Muribeca (pai de Borapitinga), que tinha sua taba sobre a opulenta Serra da Miaba
(entre Itabaiana e Lagarto) era de caráter
covarde, traiçoeiro e invejoso. Entretinha com Seregipe e Siriri relações
aparentemente amistosas, mas, na realidade, ele era o mais encarniçado inimigo
de ambos, pela inveja que lhes tinha.”
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Jukeriorana
escapou do grande massacre (os índios perderam feio) e se escondeu com guerreiros na Pedra Furada (caverna calcárea no povoado
Machado no atual município de Laranjeiras com o comprimento de 2 km).
Empreendeu visitas noturnas aos outros caciques propondo aliança. Entres estes,
Muribeca e seu filho, traidores do primeiro momento, e Japaratuba, Pindaíba e
Pacatuba, que, nesse meio tempo, já haviam se aliado aos portugueses. Por fim,
consegue montar um exército razoável (não muito confiável, mostrou-se depois) e
chega a São Cristóvão já fundada, mas não ataca. Manda um mensageiro com intimação
ao governador que embarque de imediato com os portugueses para a Bahia. Mas o
mensageiro, orientado pelos outros caciques traidores, informa as posições dos
guerreiros de Jukeriorana.
Os portugueses atacam, massacrando
e prendendo os sobreviventes. Os caciques traidores haviam retirado seus índios
para retaguarda, bloqueando a fuga dos índios fiéis a Jukeriorana.
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O
escritor cria um final feliz para o casal romântico pelas mãos de Frei Gil. O
missionário consegue converter Jukeriorana e Arycurana (já presa), e fazê-los
se aceitarem como um casal (finalmente).
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Além deste romance que agora é ressuscitado, já li “Ibiradiô” (1990) de
Gizelda Morais que trata do mesmo momento em Sergipe. Em Gizelda, constam outros
caciques não citados por Constantino, como: Surubi, Indiaroba, Aperipê, Arauá,
Baopeba... E Gizelda mostra outro perfil do conquistador Cristóvão, caracterizado
na carta de despedida que escreve ao seu substituto:
“Continuarás a guerra justa até que o último desses comedores de gente se
curve a nosso mando ou seja exterminado.”
O fatiamento de todo o território conquistado entre os soldados e
congregações religiosas, como se não tivesse dono, mostra o real objetivo do conquistador.
(Por Antonio FJ Saracura, Aracaju, 2025fev27)
Notas:
Obras do autor:
Dezena de dramas destacando-se “O
Espectro da Floresta” (1856), “A filha
do
salineiro”(1860), “O enjeitado” (1860) e os romances “O desengano” (1871), “A
filha sem mãe” (1873), “O grumete” (1873/1874), “Arycurana” (1874/1875) e “O
cego" (1877/1878).
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Li na ASL em 25/03/2025
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