O VENDEDOR DE SEREIAS, Robério Santos, InfoGraphics,150 pág,21cm,2011,Isbn
978-85-911889-0-1
O título instiga!
Deve ser um livro policial!
Mistérios, perseguições, crimes...
Antevejo o gordo Smiley, andando pelos cantos escuros de
Itabaiana, acompanhado de perto por um Robério sorrateiro após dar um nó em
Jonh le Carré.
Carrego um trauma de não ter engolido adequadamente “Ulisses”
de James Joyce e “O Evangelho Segundo Jesus Cristo” de Saramago. Fiz algumas tentativas
de dominá-los, mas tive que desistir. Eles foram muito mais fortes do que eu,
ou melhor, do que minha capacidade de entender. Aconteceu também com “Os
Sertões” de Euclides da Cunha, este quando era ainda adolescente. Não consegui
andar pelos chãos cascudos do sertão nordestino adequadamente. Retrocedi alguns
quilômetros e muni-me de um dicionário, avancei devagar. Quando cheguei ao
Homem e à Guerra, a Terra já não era a mesma inóspita e, ao final do livro, até
faria uma rocinha nela, se conseguisse comprar lá um sitiozinho de final de
semana. “Zumadunu”, de Airton Lócio, é outro livro (este sergipano) que me venceu,
mandou-me embora antes do meio. Considero um trauma, porque os livros acima são clássicos ou estão expostos nas gôndolas das livrarias da cidade. Para receber a marca de clássico é preciso impor-se. Por outro lado, nenhum livreiro manteria um livro ocupando um local assim tão nobre se não prestasse, contaminaria os vizinhos, recomendaria mal a loja.
O peixeiro Felipe, com banca estabelecida na feira de
Itabaiana, fica rico, muito rápido. Ligeiro demais para o gosto do detetive Mário
Sal (delegado aposentado compulsoriamente por problemas mentais), que declara
odiar “quem fica rico de um dia para a noite”. Vige!
Mas, em vez de Mário Sal cuidar de suas obrigações
“profissionais”, esclarecendo o mistério do enriquecimento talvez ilícito, resolve
contar seus podres ao leitor atônito, que estava muito mais a fim de ação. O provável
contraventor (Vendedor de Sereias) é mantido em um segundo plano confortável, para
desespero dos meninos de rua, das prostitutas, dos homossexuais, dos mendigos,
dos poetas em busca da rima certa, dos ricardões retardatários...
Cuidado, Itabaiana!
E então chega à cidade, saído direto do “Silêncio dos
Inocentes”, doutor Hanibal Lecter (disfarçado no italiano Bach). Ou o próprio Anthony
Hopkins em pessoa, não consigo separar um do outro. Deve ter sentido o cheiro
da sua iguaria preferida.
O detetive continua tresvariando sobre a cultura universal,
desde o poeta Mário Jorge até as teias de aranhas (seriam viúvas negras?) de psiquiatras
(ou psicopatas?) célebres. O negócio do peixeiro deslancha, deixando-o ainda
mais rico. E eu, cada vez mais agoniado...
Minha agonia começou logo na página 45 com “Alguns
Sonhos e Inverdades” indo até a “Coragem Extrema e Final” (página 141) se bem
que vivi (não vou negar) momentos inesquecíveis, com “um calcanhar sendo
desprendido da janela” (bonito e sádico) e com o beijo da “briba” albina (romântico
e trágico): Pérolas puras!
Robério Santos (poeta, fotógrafo, cineasta, jornalista, revolucionário,
professor, imortal da Academia Itabaianense de Letras... Ufa!) saiu com a câmera
na mão, à La Glauber, captando o mundo fora e dentro de seu detetive maluco (e
de outros alter egos), sem pena da gente, deixando-nos à mercê dos dentes afiados
de Lecter e da peixeira mais amolada ainda de Felipe.
Há livros que nos conduzem pela superfícies, outros pelas
profundezas e outros (como este) oscilam entre uma e outra, um turbilhão,
matando seres de guelras ou de pulmões. Parece um poema, daqueles misteriosos que pouca gente consegue aspirar todo o perfume.
O Vendedor de Sereias é uma história intrigante, macabra, profunda,
maluca.
Li duas vezes o livro inteiro e, algumas partes, muito mais vezes. Foi dureza, mas, ao final de tudo, senti-me gratificado, pelo conjunto da obra.
Li duas vezes o livro inteiro e, algumas partes, muito mais vezes. Foi dureza, mas, ao final de tudo, senti-me gratificado, pelo conjunto da obra.
(Resenha escrita em 2011, quando o livro foi lançado).
Obs:
Tenho lido nas redes sociais que O Vendedor de Sereis virou filme,
estará nos cinemas (youtube) logo, logo.
(fim da resenha)
xxx
ANOTAÇÕES FEITAS 03 DE ABRIL DE 2011 QUE SUBSIDIARAM A RESENHA ACIMA (agora, em 31 de maio de 2019, resolvi apendar aqui, para não as perder).
Antônio Saracura
(fim da resenha)
xxx
ANOTAÇÕES FEITAS 03 DE ABRIL DE 2011 QUE SUBSIDIARAM A RESENHA ACIMA (agora, em 31 de maio de 2019, resolvi apendar aqui, para não as perder).
Ao Robério Santos (retorno)
Sinto que você tem uma cultura mais livre, mais
insubordinada além de mais profunda do que a que acho que possuo. Terei que me
acostumar, ou melhor, que aprender a entendê-la.
Tecerei ligeiras impressões sobre os quatro textos que tenho
à mão de sua autoria.
1)
ADELARDO
Muito
bom. Apenas acho que se trata de uma reportagem (ou crônica). Pelo que me
parece, não é conto. Pelo menos, da maneira que vejo o conto. Mas eu não sou
especialista no assunto.
2)
CONTO CUM –
“Entrou
em casa rapidamente, abraçou seu marido. Eles fizeram amor pela primeira vez ao
som dos sapos, grilos e luz de candeeiro. O mundo havia entrado no eixo”.
Acho que deveria terminar ai em “NO EIXO”. Mesmo assim, sofri com o
estilo, fora do que estou acostumado. O texto final, após esse ponto (Nove meses depois, final de 1909 nasceu José
Vieira. José Vieira casa com Enedina...) pareceu-me
mais uma anotação para não esquecer depois, um adendo que prejudica o fim glorioso
da narração. Só acho, não tenho certeza! Afora os pequenos erros (talvez de
digitação)...
3)
O
JUMENTO
O
começo é erudito demais, chega ficou meio cansativo. O fim (End) me pareceu
meio forçado, quiçá inverossímil. Que terreno pequeno é esse? Existe? Você tem
um jeito peculiar de contar as coisas que me deixa meio desorientado.
4)
O
VENDEDOR DE SEREIAS
Acabei de ler pela segunda vez. Confesso que na primeira quase bato
pino quando você entrou dentro de Mário Sal (ou ele mesmo entrou dentro dele,
com o seu consentimento) com os desvarios para os quais não estava preparado,
como ainda não estou. Se bem que, lá na história da largartixa e do pulo do 10
andar eu gostei. Acho que tem muita poesia, se bem que sádica (lagartixa) e
macabra (10 andar). A segunda leitura me fez andar mais maneiro, se bem que ainda
sofri sobressaltos, fiquei perdido e talvez aconteça o mesmo com boa parte dos
seus leitores.
Há livros que nos levam pelas superfícies, outros pelas profundezas
das águas e outros (como este) nos puxam para baixo e nos empurram para cima, quase
nos matando, tenhamos pulmão ou guelras. Eu ainda estou me debatendo, tentando
entender o que todo o miolo do texto (da
página 45 até a 136) tem com o “Vendedor de Sereias”. Espero que não tenha sido apenas para dar
corpo ao livro, como Sal diz na página 59. Se foi, achei um corpo estranho! Um
corpo estranho mas sem deixar de ser instigante, maluco, tipo Raul Seixas ou
Mário Jorge (parece que era também). Um corpo que precisa ser dissecado para me
deixar em paz. Por fim, seu livro transita em atmosferas para as quais ainda
não estou pronto para respirar sem aparelho. Meio doidas, conforme você mesmo
diz em alguns lugares.
PS:
Bem, meu amigo... O que escrevi acima é de foro
privado. É que me senti na obrigação de dar-lhe algum feedback em vista da
gentileza que tem me dispensado.
Um grande abraço,
Antônio Saracura (03.04.2011).
xxx
O vendedor de Sereias
(rascunho de uma resenha preliminar escrito em março ou abril de 2011).
Carrego um trauma comigo de não ter engolido adequadamente “Ulisses”
de James Joyce e “O Evangelho Segundo Jesus Cristo” de
Saramago. Fiz algumas tentativas de dominá-los, mas tive que desistir.
Eles foram muito mais fortes do que eu, ou melhor, do que minha capacidade de
entender. Aconteceu também com “Os Sertões” de Euclides da Cunha, este quando
era ainda adolescente. Não consegui andar pelos chãos cascudos do sertão
nordestino adequadamente. Retrocedi alguns passos e muni-me de um dicionário, avancei
devagar. E para minha incomensurável satisfação cheguei fagueiro à Guerra e ao
Homem. E então, acolhi a terra como minha por conhecê-la agora.
Não quero igualar aqui o livro de Rogério Santos aos três
tesouros citados. Está em pauta a minha incapacidade de deglutir, do que poderia
enumerar testemunhas nem tão célebres, como “Zumadunu”, de Airton Lócio, e
alguns autores de livros repetitivos de “auto-ajuda”.
Rogério tinha um roteiro (Fillipe) e saiu com a câmara da
mão, à La Glauber Rocha, captando o mundo fora e dentro dele (e de alguns
alter-egos), nem ligando para os leitores medíocres, como eu, que mesmo
correndo, mesmo voando, mesmo prestando a maior atenção, perde-se a cada
página. Entrei em parafuso (parte III) quando o enredo passou para o mundo dos
sonhos, dos desvarios, dos desejos, das vaidades, da interação comigo, a essa
hora já enraivado e querendo voltar para casa. Pode até ser presepada de gênio,
e deve ser mesmo. Com certeza é, pois me pareceu um nível dos grandes poetas de
minha terra, desorientando-me com seus enigmas, para o que só escuto aplauso.
É um livro interessante, mas que o leitor tem que aprender a
ler e querer gostar dele. Se não pode abandoá-lo logo no inicio da parte III (alguns
sonhos e inverdades, prólogo dentro do prólogo), quando o personagem louco ou
sem juízo nenhum (só pode ser!) dana-se
a pintar telas abstratas com um pincel desgovernado. Neste ponto é que o livro
quebra de vez o comportamento prometido e solta, de vez, a franga e todo o
galinheiro. Puro desvario. Um vômito antes da ingestão (muito antes da digestão,
como cita em algum lugar). O autor abandonou a história e enlouqueceu aqui à
minha frente, que sou um leitor comprometido. “Que coisa!” E causa repulsa o que diz na página 59 (etapa
final) a deslealdade em aproveitar escritos que nada tem a ver com a história,
apenas para dar corpo ao livro. E jogo do nascimento de Jesus Cristo, só faltando
o aparecimento dos Ries magos. Mas talvez fosse o fedorendo, pela gosma
esverdeada vomitada e pela necessidade
de ser eliminado aos sete anos. Fosse um ou outro, para nada serviu, nem como
mensageiro da boa ou da má nova. E introduz
Mário Jorge Vieira (esperei Raul Seixas de braços dados com Paulo Coelho
navegando num caule de maconha. O outro ego de Robério transita maluco da página 15 a 109, passando
aqui a falar de coisas mais doces, como a lagartixa degolada ou o amigo voador.
Tocaram-me pela beleza trágica e sádicos os capítulos 15 e 20. E no 21 volta de novo o teto rachado
de Paes Leme. Até o capítulo a página 139 pouca coisa o leitor menos doido
consegue absorver. As sete folhas finais conclui a novela do vendedor de sereias
na feira de Itabaiana, abandonada na página 59.
Para dizer que o personagem (Mário Sal) era perturbado
bastava uma frase (acho!).
O ENFP (quem sou eu?) ficou tedioso, até agressivo, para os
que não são iniciados em Carl Gustv Jong. Aparentemente (para os menos
eruditos) este texto nada tem a ver com o tema do livro. O texto revela Mário
ou Robério? Pode ter dado corpo ao livro, mas corpo estranho, que dificuldade o
entendimento do leitor comum.
Depois de quase soçobrar no turbilhão do sonho de Herminiano
(página 47, que comentei no parágrafo anterior), as estradas seguintes ficaram
mais maneiras e até muito bonito e trágico, como o 15 com o poema da lagartixa,
e muito bonitas e sádicos como o capitulo 20 e o filme insólito do amigo desde
o calcanhar sumindo no patamar da janela até o monte de fatos na rua. Até o capitulo
20, onde o sonho de Emiliano é recontado com o mesmo texto, agora muito mais
amigável. Se bem que continua provocando leitores bem comportados (como eu)
pois veja o nascimento do menino Jesus ao avesso, não serviu para nada depois.
E em algumas horas, ainda me confundi se não era Robério que falava no lugar de
policial esquizofrênico (?) Mário Sal. Os capítulos curtos facilitam a leitura,
as citações de clássicos amenizam muito as feridas, como a (dispensável)
pedrada no alto da colina, que bem poderia não ter sido escrita.
Confesso que andei meu perdido na primeira leitura. E na
segunda, um pouco menos, mas perdido também. Era essa a intenção?
Para escrever sobre esse livro prefiro dizer que a prosa de
Robério é um poema, daqueles poemas misteriosos que pouca gente consegue aspirar
todo o perfume. Para escrever-se sobre O Vendedor de Sereias precisava de um
livro até maior do que ele.
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