À SOMBRA DA MANGUEIRA E OUTROS
CONTOS, Adélia Mota, infographics, 2019, 71 páginas, isbn 978-85-9476-203-0
Adélia Mota é professora e ensina
no Colégio Mauá (e outros) e sempre a vejo de relance por onde ando nessa minha
missão de escrever e divulgar livros. Eu gostei da escrita leve, ágil, consistente
desse primeiro conto (já que sempre pulo prefácios e apresentações), “A Beleza
do Óbvio” do livro magrinho, “À Sombra da Mangueira e outros Contos”, de Adélia
Mota, itabaianenses universal. E, por isso, resolvi ler o livro inteiro...
Vi em Pedro arrebatado (a Moça
com o livro de Bandeira), trair-se profissionalmente, o poema de Manoel Bandeira
prende-o inapelavelmente à desconhecida moça que pagou a conta pela metade. Há
um silêncio mágico na escrita que nos permite ouvir os corações pulsando,
sentir a pureza das almas. Em meia página, o conto mostra uma vida inteira:
comprimida, trágica, lírica.
Carlos Castanheda, em algum
trecho de Viagem à Ixtlan, fala de um lugar acolhedor reservado para cada um de
nós; até no meio do deserto de Sonora, camufla-se entre os cactos hirsutos ou na
ventania que zoa. Se tivermos a sorte de achá-lo, desfrutaremos a essência de
nosso ser, como se o paraíso fosse inteiramente nosso, os desejos íntimos,
mesmo os não reconhecidos, realizam-se milagrosamente.
“No silêncio e na solidão (do
quintal cheio de árvores de minha meninice) construí os melhores dias de minha
infância”, escreve a autora logo no início do conto: À Sombra da Mangueira.
Se eu não tivesse também um lugar
assim acolhedor, tomaria agora emprestado este, de Adélia, que, certamente, é o
mesmo de que fala dom Juan em Ixtlan.
Ailton, como eu aposentando e claudicante,
sentiu-se um cavalo selvagem e sai em busca de sonhos confusos. Felizes os que
têm um anjo da guarda zeloso.
Dona Ritinha é a guardiã dos
falsos valores que matam muito mais do que bala, câncer e solidão. “Boa noite,
lindo rapaz, entre e venha tomar comigo um cafezinho com pão de ló!”
Pareceu (“Entre sapatos e
chinelos”) uma história comum, até óbvia, mas há um cão andando junto que faz a
gente, estranhamente, chorar.
A gata Mimi entrou sorrateira
fugindo do dilúvio, aproveitou a porta aberta para a bicicleta passar. Só o
olho do escritor atento vê fatos assim corriqueiros mas que dão vida à vida. A
amizade faz-se forte até pela indiferença. E Mimi morta revela um mundo bruto
que precisamos amansar.
“O Museu de lembrança” traz-me
uma palavra de meu povoado (talvez de muito mais lugares ) numa frase
cinematográfica: “Estava com a roupa rasgada, e com a boca cortada por um murro que levei de um garoto mais
velho.”
Parei aterrorizado em “Quando
Pedro enlouqueceu”, para anotar que a mãe não pode dar-se ao luxo de ficar
louca, melhor que a filha engula os cordões das redes desfiadas.
...
Adélia escreve devagar, não deixa
nada escapar, pinta o ambiente em volta e o mundo interior, mas apenas o que
interessa mostrar. E o faz de um jeito peculiar, que encanta e que assombra.
Antônio Saracura, Aracaju 13 de
outubro de 2019).
xxx
Biografia de Adélia, escrita por
ela mesma, na página 72 de seu livro: “Adélia Mota pouco tem a dizer sobre si.
É itabaianenses de coração, professora e, acima de tudo, leitora. Este livro é
um exercício de terapia e criatividade para alguém que encontrou, nas palavras
escritas, uma forma de expressar sentimentos e emoções.”.
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