domingo, 13 de outubro de 2019

À SOMBRA DA MANGUEIRA E OUTROS CONTOS, Adélia Mota

À SOMBRA DA MANGUEIRA E OUTROS CONTOS, Adélia Mota, infographics, 2019, 71 páginas, isbn 978-85-9476-203-0




Adélia Mota é professora e ensina no Colégio Mauá (e outros) e sempre a vejo de relance por onde ando nessa minha missão de escrever e divulgar livros. Eu gostei da escrita leve, ágil, consistente desse primeiro conto (já que sempre pulo prefácios e apresentações), “A Beleza do Óbvio” do livro magrinho, “À Sombra da Mangueira e outros Contos”, de Adélia Mota, itabaianenses universal. E, por isso, resolvi ler o livro inteiro...

Vi em Pedro arrebatado (a Moça com o livro de Bandeira), trair-se profissionalmente, o poema de Manoel Bandeira prende-o inapelavelmente à desconhecida moça que pagou a conta pela metade. Há um silêncio mágico na escrita que nos permite ouvir os corações pulsando, sentir a pureza das almas. Em meia página, o conto mostra uma vida inteira: comprimida, trágica, lírica.


Carlos Castanheda, em algum trecho de Viagem à Ixtlan, fala de um lugar acolhedor reservado para cada um de nós; até no meio do deserto de Sonora, camufla-se entre os cactos hirsutos ou na ventania que zoa. Se tivermos a sorte de achá-lo, desfrutaremos a essência de nosso ser, como se o paraíso fosse inteiramente nosso, os desejos íntimos, mesmo os não reconhecidos, realizam-se milagrosamente.
“No silêncio e na solidão (do quintal cheio de árvores de minha meninice) construí os melhores dias de minha infância”, escreve a autora logo no início do conto: À Sombra da Mangueira.

Se eu não tivesse também um lugar assim acolhedor, tomaria agora emprestado este, de Adélia, que, certamente, é o mesmo de que fala dom Juan em Ixtlan.

Ailton, como eu aposentando e claudicante, sentiu-se um cavalo selvagem e sai em busca de sonhos confusos. Felizes os que têm um anjo da guarda zeloso.

Dona Ritinha é a guardiã dos falsos valores que matam muito mais do que bala, câncer e solidão. “Boa noite, lindo rapaz, entre e venha tomar comigo um cafezinho com pão de ló!”

Pareceu (“Entre sapatos e chinelos”) uma história comum, até óbvia, mas há um cão andando junto que faz a gente, estranhamente, chorar.

A gata Mimi entrou sorrateira fugindo do dilúvio, aproveitou a porta aberta para a bicicleta passar. Só o olho do escritor atento vê fatos assim corriqueiros mas que dão vida à vida. A amizade faz-se forte até pela indiferença. E Mimi morta revela um mundo bruto que precisamos amansar.

“O Museu de lembrança” traz-me uma palavra de meu povoado (talvez de muito mais lugares ) numa frase cinematográfica: “Estava com a roupa rasgada, e com a boca cortada por um murro que levei de um garoto mais velho.”

Parei aterrorizado em “Quando Pedro enlouqueceu”, para anotar que a mãe não pode dar-se ao luxo de ficar louca, melhor que a filha engula os cordões das redes desfiadas.

...

Adélia escreve devagar, não deixa nada escapar, pinta o ambiente em volta e o mundo interior, mas apenas o que interessa mostrar. E o faz de um jeito peculiar, que encanta e que assombra.
Antônio Saracura, Aracaju 13 de outubro de 2019).  

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Biografia de Adélia, escrita por ela mesma, na página 72 de seu livro: “Adélia Mota pouco tem a dizer sobre si. É itabaianenses de coração, professora e, acima de tudo, leitora. Este livro é um exercício de terapia e criatividade para alguém que encontrou, nas palavras escritas, uma forma de expressar sentimentos e emoções.”.

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