UM BATIM NAS MEMÓRIAS DE UM MENINO PROPRIAENSE, José Alberto Amorim, 2. Edição, Performance (Arapiraca-Alagoas, 2021, 155 páginas, isbn 978-65-87637-85-3.
Fui à I Feira Literária de Propriá realizada nos dias 9 e 10
de novembro de 2022, quando nem acabara ainda a Feira do Livro de Itabaiana (dias
4, 5 e 6), estropiado pela luta que é organizar uma feira de livro de três
dias. Fui porque me intimou Ronpelim (Ronaldo Pereira Lima), cronista admirável
do beiradão, a participar de uma mesa de debates.
E lá chegando de carona com José Ginaldo de Jesus, que
lançaria seu “Chistis” na comunidade católica (ele é líder nesse mundo santo),
comecei a conhecer pessoas abnegadas, como os componentes do CCP (Centro
Cultural de Propriá) que organizou a Feira no peito, destaque para o próprio
Ronpelim e sua esposa Macléia, para o escritor Amorim, para o empresário Franklin, para Sérgio, entre outros.
O meu livro “O Menino Amarelo” foi adotado por visitantes da
Feira e viajou (doei exemplares) a escolas que demonstraram interesse nele.
E com o escritor José Alberto Amorim, autor de “Um Batim nas
Memórias de um Menino Propriaense” fiz permuta de "O Menino Amarelo", com o dele, procedimento
que me agrada e sempre busco, porque meu livro se espalha e tenho a chance de
conhecer novos autores.
xxx
Acabei de ler o livro de Amorim, que é um batim (brincadeira de
pular no rio provocando baticum, espanando água, sem registro no Aurélio) nas
memórias de Propriá. Em cada caso contado, em cada tipo apresentado transparece
a cidade meio rural e ribeirinha com sua cultura, suas manias, seus jeitos
próprios de viver.
São 154 páginas enxutas, tratando inicialmente das pessoas
próxima, dos amigos de infância (muitos perduram), entrando em tipos
folclóricos, nos portentosos e nos doidos que em todo lugar há, nos artistas...
E sempre o rio São Francisco deslizando manso no leito ou brabo invadindo
espaços.
A ponte que fez um bem danado pois integrou o País fez muito
mal ao lugar: deixou a cidade de lado, como se fosse agora apenas uma peça de
decoração. Adeus os cinemas lotados, os clubes sociais festeiros, o comércio
ativo, os mecanismos de conexão que geria.
As relembranças discorrem gostosas, dando vida ao lugar que
se foi no passado, pela pena hábil do autor enquanto menino.
“Dona Querubina me mandava pegar uma lata de areia grossa na
beira do rio. Peneirava e colocava a areia no fogo em uma panela de barro. Quando
estava quente tinindo, jogara caroços de milho alho em cima, tapando-a com um
texto. Todos ficávamos torcendo e esperando os papôcos dos caroços virando a
saborosa pipoca, que algumas vezes era a principal refeição do dia”.
“Na padaria de seu Pedro Pinto, quem levasse uma mochila
ganhava um pão de graça. E Tânia, muito esperta, se oferecia para comprar os
pães de Dona Dalina e comia a vantagem na rua mesmo. Era sua paga”.
“Em abril de 1964, começaram as prisões de cidadãos que os
militares suspeitavam serem comunistas. Na rua Capela morava o açougueiro e
vereador Eronides Trindade (conhecido por Lila). De manhãzinha, Lila percebeu
que sua casa estava cercada, soldados batiam na porta para o prender. Tentou
fugir pelos fundos, também havia lá um soldado de plantão. Alcançou um galho da
goiabeira do vizinho e, de comum acordo, subiu no muro e se escondeu lá em cima
até não aguentar mais. Então desceu e tentou negociar com os soldados. O tenente
exigiu, para não o prender, que ele assinasse documentos incriminando o
prefeito, doutor Geraldo e o irmão deste, Deputado Cleto Maia. Lila se irritou:
‘Pois me levem pra rua e me fuzilem ou me prendam, não assinarei em falso
testemunho, eles são homens de bem, só ajudaram os pobres”. Lila foi algemado e
pegou cadeia por 62 dias”.
“A rua de Serapião é um dos mais tradicionais logradouros da
cidade. Quase tudo acontece nela e por perto. E logo na esquina, morava seu
João Lampião, o irmão mais novo do rei do cangaço. Quando a molecada debochava
dele, a reação era ameaçar com espingarda. Quem defendia os meninos era a irmã
Vilma, que morava com dona Francisquinha, a mãe de João, mais à frente”.
“Que risco corríamos para roubar frutas no farto pomar de seu
Martinho Bravo. Quando estávamos no bem bom, ouvia-se o pipocar da espingarda
soltando sal em pedras. Como escapar, no desespero, cinco meninos por um buraco
onde só cabia um”.
“Os melhores pastéis da
rua de Serapião eram os de dona Djalva, que todos chamavam Vavinha. Massa fina,
com recheio de saburica (camarão sossego), batatinha, arroz xerém, verduras e
alguns segredos”.
“O Sapateiro José de Castro, homem de atitudes diretas, não
admitia conversinhas fiadas, era o nosso ‘seu Lunga’”...
E por aí vai...
Uma riqueza imensa de memórias que faz do livro “O Batim nas
memórias de um menino propriaense” rico, divertido, um documento de valor, que,
no mínimo, será fonte de pesquisa para historiadores, como escrevia Luiz
Antônio Barreto a revém dos livros de outro autor, Antônio Saracura, em artigo
publicado no Jornal do Dia, de 20/05/2011.
Por Antônio FJ Saracura, em 2022dez11)
li na ASL em 12/12/2022
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