EU NÃO VIM FAZER UM DISCURSO, Gabriel Garcia Marques, tradução
de Eric Nepomuceno, Rio de Janeiro, Record, 2011
EU NÃO VIM FAZER UM DISCURSO, Gabriel
Garcia Marques, tradução de Eric Nepomuceno, Rio de Janeiro, Record, 2011.
A obra de Gabriel Garcia Marques mostra
o amor sem quartel à literatura, ao desbaste da gramática pomposa, ao fio da
meada nítido, a paixão pelo jornalismo que marcou sua escrita ligeira e
translúcida. O escritor nasceu pronto, sempre escreveu para ser lido por todos,
conduzindo a trama pela superfície do fácil entender, mas revelando ciências
que outros gastariam muitas vezes mais para mostrar.
O livro “Eu não vim fazer um discurso”
reúne quase tudo que ele usou pra encantar as plateias, quando se viu obrigado
a fazer discursos, ao lhe darem prêmios pela sua obra. Equivale a dizer: quando
se sentiu obrigado a cometer duplo pecado. Pois prometera a si nunca receber
prêmios e nem fazer discursos (página 18).
O livro se compõe de 21 discursos
concisos para que cada ouvinte na plateia não tivesse tempo de abrir a boca
enfadado, terminava antes. E fossem assimilados integralmente, pela
objetividade. Poucas palavras dizendo muito, que é um princípio do bom
jornalismo (e da boa poesia).
Na Academia do Dever em Zapaquirá,
Colômbia, em 1944, com 17 anos de idade, por ocasião da despedida da turma no
colégio. Em Caracas na Venezuela, 1972, ao receber o prêmio Rômulo Galegos pelo
seu livro “Cem Anos de Solidão”. Na cidade do México em 1982, ao receber a
Ordem da Águia Azteca. E alguns outros. Como este em Estocolmo na Suécia, em
1982, na cerimônia de entrega do Prêmio Nobel de Literatura. E outro discurso
em Estocolmo, também em 1982, em baquete oferecido pelos reis da Suécia em
homenagem aos ganhadores do Nobel naquele ano. E o último discurso, em 2007, em
Cartagena das Índias, na Colômbia, diante das academias de línguas e dos Reis
de Espanha...
Aqui, Gabriel completava 80 anos de
vida, 40 anos da publicação de “Cem Anos de Solidão” e 25 do prêmio Nobel. E relembra,
no discurso, a dura fase de sua vida quando escrevia seu maior romance, que lhe
deu de presente o mundo inteiro.
"Aos meus trinta e oito anos, com
quatro livros publicados desde meus vinte anos, me sentei na máquina e escrevi
durante dezoito meses. Não deixei de escrever um único dia. Naquele tempo não
ganhei um único centavo, nem sei como Mercedes, eu e dois filhos fizemos para
sobreviver. (...) Por fim, o livro estava concluído. Era o começo de 1966.
Mercedes e eu fomos a uma agência do correio da cidade do México para o enviar
para Buenos Aires (onde o editor imprimiria), “Cem anos de Solidão”, um
calhamaço com 590 páginas escritas à máquina. Custava para o enviar oitenta e
dois pesos, mas só tínhamos cinquenta e três. Então resolvemos mandar a metade
das folhas. Por descuido, mandamos a metade errada, o final do livro. Paco
Porrua, nosso editor da Sudamericana, ansioso para conhecer a primeira parte
(deve ter gostado muito da segunda) remeteu-nos o dinheiro necessário para
enviar o resto".
Hoje, os leitores de “Cem Anos de
Solidão”, se vivessem em um único pedaço de terra, este lugar seria um dos
vinte países mais povoados do mundo.Tem mais de 50 milhões de exemplares
vendidos e já foi traduzido para 46 línguas diferentes.
(Apenas para relembrar):
“Cem anos de solidão” se passa no
vilarejo fictício de Macondo e acompanha a longa trajetória da família
fundadora da cidade, os Buendía... A história é construída a partir do
realismo fantástico, corrente literária que mescla realidade com elementos
mágicos. (Leia mais em: https://super.abril.com.br/cultura/conheca-a-historia-de-cem-anos-de-solidao-que-vai-virar-serie-na-netflix/)
Por Antônio FJ Saracura, em 05 de
agosto de 2022, em Aracaju.
(PS):
E apenas para contradizer o que falei sobre
a translúcida escrita de Gabriel no início desta resenha: O livro “O Outono do
Patriarca", do mesmo autor, que foi publicado logo após "Cem a nos de
solidão" pareceu-me um bloco de granito de 300 toneladas, eu não consegui
ler nem dez páginas seguidas. É poema que chora/canta a solidão do poder,
centrado nas contradições das ditaduras latino-americanas; não deu para
mim.
Publicado na Zona Norte 2022
ResponderExcluirLi na ASL em janeiro de 2023
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