quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

A AVENTURA DE SAMAEL, NA TERRA TRÊS RIOS

 

A AVENTURA DE SAMAEL, NA TERRA TRÊS RIOS, Evandro Ximenes, Offset Editora Natal, 2020, ra 172 páginas, isbn 978-65-990089-5-5

 



Eu tenho Groaíras (cidade pertinho de Sobral, no Ceará) como um pouco minha. Ouvi tantas histórias sobre Groairas da boca de Domingos Pascoal de Melo nas viagens pelo interiorzão de Sergipe, na plantação de sementes para o despertar e democratização da leitura e da escrita, que misturei Groairas com minha Itabaiana. Terra Vermelha e o Cantodohamaistempo me parecem o mesmo lugar, com os rios Jacaracica e Groaíras cheios pelos olhos dos paus e correndo um ao lado do outro.

Sobre o livro "A Aventura de Samael"... 

O prólogo do livro me ouriçou. Estava adentrando na intimidade de um lugar e é delas que brotam grandes narrativas. Os costumes, a geografia, o povo... E aquele moleque traquinas que transpirava adrenalina... seria meu novo herói.

Mas...

A tropa de ciganos passa à cavalo por uma estrada, e membros proferem longos discursos que mais caberiam numa sala de aula ou no púlpito de uma igreja. Pode ter acontecido desse jeito mas o narrador não pintou tela para isso.

O autor escreve que vai contar um fato. Bastava contar. Encomprida os desenlaces. Revela a surpresa que é essencial postergar na prosa (capitulo três página 39), como o final da trama que o romance ainda vai desenvolver: o rigoroso castigo que cabe a Helena e agregados pelo atrevimento de desfrutar a felicidade fora dos paradigmas da absurda lei divina (judaica).

Há esbanjamento de filosofia, doutrinas religiosas, mistérios suspeitos dos livros sagrados, sabedorias canônicas... Sem o contexto exigir. Ficou parecendo afetada retórica fora do lugar.

O velho andarilho (bom personagem com excelente entrada e postura) desvia o rumo e faz brotar o miolo de um novo livro: Os antecedentes, o julgamento a condenação da família modelo. Mais um crime da absurda Santa Inquisição. Como não encontrei bibliografia que garantisse ter sido fato histórico, senti que um alienígena roubou a metade do romance esperado.

Há personagens marcantes, como o ermitão, Francisco do Espírito Santo e Torquemata. Mas o primeiro não merecia a má fama apregoada de tarado praticante de zoofelia. E o segundo (espero que não seja fato histórico) não merecia ser pintado com seus “apolos” em libidinosa orgia. Não me pareceu justa a associação de ermitão asceta às taras animais nem a de fanático religioso à pederastia. 

Como o protagonista Samael, que tem o poder do Cão, pois é o próprio, não anteviu a desgraça que aconteceria aos seus (havia ido à Sobral comprar mantimentos) e, além do mais, quando retorna e sabe, covarde foge?

Que diabo fraco e frouxo é esse? Nem parece que é o personagem principal que confere o título da obra. 

Torci em vão para o autor conectar as famílias remanescentes dessa aventura (descrita com maestria desde a denúncia ao julgamento de condenação da família modelo) às atuais famílias que constituem Groaíras (Ximenes, Feijões, Melos...). Os fracos links que contem, como Deolino, como Pietro Cesar e seus descendentes, como os dois padres espertos portugueses, Lucião e Mancião, não deixaram rastros claros apenas indicações. Ficou clara apenas a herança da prática da zoofelia praticada pelos moleques do lugar.

Julgo que Evandro Ximenes pode escrever um grande livro sobre o valoroso povo que desbravou e colonizou esse belo canto sombreado de imponentes buritis. Mostrou que pode.

 (Por Antônio Saracura, em 29 de outubro de 2020).

 

 

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