quarta-feira, 11 de maio de 2022

JULHO, Jorge Carvalho do Nascimento

 

JULHO, Jorge Carvalho do Nascimento, Criação Editora, 2021, 112p, isbn 978-65-88593-57-8.



Preocupei-me com eventos e datas e os procurei reter, certamente iriam me fazer falta mais à frente, mas não fez. E lendo "Julho" eu me perguntava por que Vera precisava me dizer tudo que disse até repetir? Sobre discriminar o pai o pai por não ser branco lavado e por lhe despertar desejos estranhos (carnais certamente). Também sobre a avô Celuta,  que batucava com o garfo no prato de comer. Sobre a repulsa que sentia ao marido pelo parentesco suposto com o pai...  (sugestão de implícita concorrência). 

Espantei-me com o testamento no qual privilegiava arianos, reservando parte da fortuna (que nem pareceu grande) para a Ku, Klux Kan, mão impiedosa da insensatez. Precisava mesmo haver no enredo este disparatado testamento? Ouvi as conotações racistas alto demais como se meu pai exemplasse Jaime e quisesse que os dez filhos ouvissem também. Este testamento inverossímil e este racismo exacerbado me pareceram próteses implantadas depois da estátua feita, aquela pincelada extra que pode estragar a tela.  

O capítulo XVII repete parágrafos, que não consegui atribuir à arte literária.  E ninguém sequer tocou nesse ponto. Será que apenas o meu exemplar foi premiado? 

E, dessa forma, claudiquei, até que no capítulo XXII veio o enredo fluente, ritmado, que me segurou firme, fazendo-me esquecer o oxímetro (o Covid-19 mata sem pena)  que me olhava de esguelha na cabeceira da cama.

Não posso, entretanto, deixar de registrar pontos que atordoaram minha serenidade de leitor curioso:

. “As acusações são também dirigidas à mamãe e à Marisa... Essas pessoas são responsabilizadas pelos erros cometidos pelo papai...” Que erros? (página 71).

. “Argumentou que inconscientemente eu atribuía todos os meus insucessos a ele (meu pai?) e a minha irmã”. Como assim? Se o pai foi descrito sempre como pessoa de sucesso e que a protegia? Sobre as irmãs, há apenas referências soltas em momentos como nas páginas 21 e 102.

. “Eu queria que meu advogado argumentasse que papai me ameaçou de morte...”. Não vi na parte anterior da trama essa colocação sequer subentendida. Um personagem, mesmo insensato, não tem o direito de plantar argumentos insensatos nem de propor que alguém os use (página 94).

. “Os que mataram meu pai e minha mãe queriam colocar a responsabilidade em cima de mim. Eles sabem que sou a parte mais fraca, a pessoa de menor prestígio social e econômico...”. Vera disse antes (e o narrador ratificou com seu silêncio) ser uma pessoa de sucesso (página 21). E constou (não houve nem sugestão contrária) que a mãe teria morrido de morte natural (página 94). 

“Todos que cercavam papai e Myrna sabiam que eles viviam em um vale de lágrimas. A infelicidade de todos nós não conhecia limite”. Não foi bem isso que Vera (ou alguém) disse na primeira parte do livro (página 89).

Assim eu fico doido também...

Estou aqui transcrevendo anotações de pé de página) em 08 de julho/2021 quando, pelo menos, cem personalidades de nobre estirpe, teceram sobre o livro de Jorge Carvalho, loas. E nenhuma delas sequer anotou, de longe mesmo, o que senti e registrei. Isso me obriga a reler o livro ou me internar Clínica São Thiago ou São Marcelo espontaneamente. 

Então o reli.

E me somo aos demais leitores que se expressaram festivamente à novela de Jorge. 

Nunca mais vou ler livro se estiver infectado com o vírus corona, ele faz a gente ver tortura na reta. 

(Aracaju, 15 de julho de 2021, Antônio FJ Saracura)

 

 

 

 

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