sábado, 18 de março de 2023

A GAROTA NA TEIA DE ARANHA, Millenium 4, David Lagercrantz

A GAROTA NA TEIA DE ARANHA, Millenium 4, David Lagercrantz, 1.edição, São Paulo, tradução de Fernanda S. Akesson e Guilherme Braga, isn 978-85-35-92-6101.

 Mikael Blomkvist ressuscita a revista Milenium, que caía aos pedaços e os novos donos já planejavam jogá-la no lixão. Com o sucesso da reportagem, o grupo fundador compra de volta as ações da revista, que fora no passado, a mais importante da Suécia. E Mikael retorna ao pódio que sempre foi dele, o maior jornalista investigativo do País, quiçá do mundo.

As grandes multinacionais envolvidas no escândalo (roubo de tecnologia e assassinatos) têm suas ações desvalorizadas na bolsa, provocando uma quebradeira em cadeia.

Ove Levin, o dono do grupo norueguês Serner, que monopolizava a área de comunicação nesta parte do mundo, “foi ver, naquela manhã, como andavam suas ações. Costumava ser um bom estimulo para as manhãs de ressaca. Pegou o celular a acessou sua conta bancária e, a princípio, não entendeu nada, estava zerada. Suas ações haviam sofrido uma queda impressionante. A participação da Solifon (conglomerado foco da reportagem) havia quase desaparecido...

 

A reportagem da Milenium ocupou mais de 30 páginas e foi manchete em todas as revistas sérias do mundo. A mídia em geral não tinha outro assunto a não ser a história do cientista Frans Balder e de seu filho August, autista, depois diagnosticado como savant (ilha de genialidade).

August, menino de oito anos, presencia o assassinato do pai. Apesar de suas limitações, encontra uma maneira de se vingar. 

A reportagem vasculha o novo mundo da vigilância e da espionagem, em que as marcas que delimitam a fronteira entre o legal e o ilegal se apagaram. Os repórteres investigativos, tendo à frente Mikael, se envolvem numa perigosa trama internacional, enfrentam assassinos, hackes, espiões. E usam, eventualmente, as mesmas armas dos criminosos, como o hackeamento de bancos de dados, especialidade da espetacular Lisbeth Salander.

Sim, ela mesma, Salander. Efetiva, invencível, impiedosa.

“Uma heroína diferente de todas as outras. O clímax é um festim sangrento” (conforme The Times).

E sua irmã gêmea, a bela e má Camile, vem da Rússia tenebrosa onde manobra a triste herança do pai, que usurpou. Mas não é desta vez que uma das irmãs vai eliminar a outra. Camile perde a batalha e some na escuridão para reorganizar sua tropa e talvez retornar outro dia.

Ufa! Haja fôlego!

Um romance do mesmo nível dos anteriores escritos pelo criador da série, Stieg Larson. Foi bom demais o ler, pois eu andava dispersivo, abandonando livros nas páginas iniciais e já achando que a culpa era minha. Li as 484 páginas de “A Garota na Teia de Aranha” de um fôlego só.

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Este é o primeiro livro da série Milenium em que o autor não é mais Stieg Larson, falecido quando concluiu a primeira trilogia, composta pelos excelentes romances: “Os homens que não amavam as mulheres”, “A menina que brincava com fogo” e “A rainha do castelo de ar”(Fiz uma resenha deste em fevereiro de 2010, e que consta deste Blog).

“A Garota na teia de aranha” é de autoria de David Lagercrantz, jornalista sueco, autor de diversos romances. E já publicou mais dois romances da série (vou correndo à Estante Virtual comprar, pois quero ler também): “O Homem que buscava sua sombra” e “A Garota marcada para morrer“. 

meu ver, David substitui Stieg a contento. 

  Aracaju, 2023mar18, Antônio FJ Saracura


 


quarta-feira, 15 de março de 2023

O CORAÇÃO DAS TREVAS, Joseph Conrad

 

O CORAÇÃO DAS TREVAS, Joseph Conrad, edição especial, Nova Fronteira, 2017, tradução de Mascos Santarrita, 128 páginas isbn 978-85-209-3575-0

 


“Logo aos 17 anos, o polonês Joseph Conrad começava a sua carreira como marinheiro. E poucos anos depois, partia rumo ao Congo, em nome de uma companhia de comércio Belga.

Lá, viveu na pele a realidade da colonização, desde a crueldade obscena até a completa indiferença para com o sofrimento alheio. E foi nesse ambiente, em meio à miséria e à doença, onde conheceu com os próprios olhos o “Coração das Trevas”, o qual viria a retratar magistralmente anos depois.[1].

O livro “O Coração das Trevas” é um clássico da literatura universal e tem 120 páginas na edição especial da Nova Fronteira.

O narrador, em uma escuna encalhada no Tâmisa enquanto espera que a maré suba, narra para uma roda de marinheiros conquistas na marinha inglesa pelos mares do mundo. Os ouvintes entediados estão quase a dormir, pois a noite chega e a escuridão toma tudo em volta. Então Morlow, um dos ouvintes, tome a palavra.  Ele é marinheiro dos mares e navegar ali no rio o deixa agoniado. E conta a história que ele mesmo viveu: uma empreitada no Rio Congo, no coração da África. Submeteu-se ao rio, pois era um tempo de emprego difícil e não aguentava mais esperar o navio que nunca ficava pronto e nem a promessa de emprego que não se concretizava. Soube que havia uma vaga, submeteu-se enquanto esperava o mar. A companhia holandesa precisava de capitão para conduzir um vapor no Rio Congo, região onde explorava riquezas. O anterior havia morrido em um acidente. Morlow sabia que os civilizados saqueavam o continente negro, matando e escravizando nativos, roubando tudo de valor sobre a terra e embaixo dela.

E viajou para a África em busca de seu vapor e o encontrou afundado. Precisava fazê-lo submergir e o reparar. No entreposto da companhia, enquanto fazia o serviço, viu um clima ruim demais. Ninguém confiava em ninguém. Escravos e nativos eram degolados à revelia. Os líderes se digladiavam na surdina ou abertamente. Teve a sensação que entrara em uma briga no escuro, com inimigos por todo lado. Como escapar da estocada fatal e como desferir o golpe certeiro?

A primeira missão seria resgatar um missionário-colonizador da Companhia dona do navio, o doutor Kurtz, que sumira na selva, não prestava contas à companhia, e agia como um Messias. Selvagens fanáticos e sanguinários o seguiam cegamente. A informação que se tinha era de que acumulara imensa riqueza em marfim, o ouro de então, e que estava muito enfermo, em risco de vida.

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A trama do romance não é linear. Não é clara no rumo e nem das conexões de pontos, que se soltam e se prendem incessantes. Surgem fatos aparentemente sem lógica que assombram. Não existem mocinhos, mas uma montanha de seres se debatem, sem liderança em uma terra de ninguém.

E o vapor mal reconstruído começa a navegar para o coração da África, cumprir a missão. O clima em volta e nos portos é de suspense, de desgraça anunciada. Eventos surreais, assombrosos. Uma imensa Treblinka é pintada por cegos e os pincéis são cabeças decepadas.

Dá uma impaciência, dá uma agonia, dá uma tristeza... Revolta, indignação, imensa insegurança.

“Um terror, um terror” conforme o missionário enfermo, finalmente, resgatado, pronuncia ao morrer.

Xxx

E eu me pergunto como Francis Coppola extraiu o monumental filme “Apocalipse Now” deste pequeno romance de Joseph Conrad? Assisti ao trailer para relembrar e penso que “O Coração das Trevas” entrou com o clima insustentável, o alopramento dos seres humanos, o pouco caso à vida, a insensatez de atos, a horrenda rapacidade branca contra as demais raças. No livro, os negros africanos e, no filme, os asiáticos do Vietnan, em guerra com os Estados Unidos, na época, e as selvas do Camboja, onde habitava o Kurtz de então.

O horror do romance tomou conta do filme. O mesmo que era o senhor da vida nos dois momentos flagrados, que são eternos.

Aracaju, 2023fev06, Antônio FJ Saracura.



[1] Texto colado do “Clube de Literatura Clássica e publicado no Facebook.