segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

HISTÓRIA SUCINTA DE SERGIPE, Evande dos Santos

 

HISTÓRIA SUCINTA DE SERGIPE, Evande dos Santos, Fontenele publicações São Paulo, 2021, 184 páginas, Isbn 978-65-5871-04-9

 

No final de 2013, comecei a trabalhar nas livrarias de Aracaju, em um projeto que chamamos de “O Escritor na Livraria”. Com alguns escritores (todos tímidos inicialmente) íamos as livrarias nos finais de tarde, mais a partir das quintas-feiras e abordávamos os visitantes, convidando-os a conhecerem livros da nossa literatura, que levassem para casa uma obra sergipana à venda na loja.


Nas quintas-feiras à noitinha, realizávamos um sarau em homenagem aos presentes. Declamávamos poemas, líamos trechos de nossa prosa, vendíamos nosso peixe. Visitantes se entusiasmavam e também declamavam poemas ou falavam de livros que haviam lido.

Com a pandemia, muitos escritores debandaram e não retornaram ao finar a praga.

Entretanto, alguns persistem e continuam marcando ponto nas livrarias, lançando obras continuadamente, uma ou duas horas por semana, a critério e resistência de cada. O Escritor na livraria é muito útil para autores e para literatura sergipana, porque os representamos ante público anônimo e sem dono. Prestamos consultoria aos leitores sobre a literatura em geral, os vendedores apelam para o escritor quando o leitor busca um livro sobre um assunto mas não sabe o nome do autor nem o título.  Assim, as livrarias de Aracaju (gerentes e vendedores) findam conhecendo os autores e os livros sergipanos e os podem, com segurança, oferecer à clientela.

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“Preciso de um livro que conte a história de Sergipe de forma simplificada, sem detalhamento cansativo.”  Sempre há alguém querendo.

Os clássicos são extensos e só podem ser encontradas em bibliotecas especializadas. Há obras resumidas, também fora de circulação, como a “História de Sergipe” do professor Acrísio Torres de Araújo, que circulou no final dos anos 60 e esquecida. Há o livro “Sergipe Sociedade e Cultura” do professor Antônio Wanderley e outros, de 2007, edição do autor, 176 páginas, que mais um livro-apostilha de aula.

 

 

Quando surgiu no  mercado, o livro “história do Brasil para quem tem presa”, de Marco Costa, com 118 páginas, editora Valentia em 2016, com cópia em Áudio book, levei-o à Academia Sergipano e expus minha ideia de algum historiador nosso pudesse escrever um assim sobre Sergipe. Houve apartes e o historiador e presidente José Anderson Nascimento, disse que iria avaliar as possibilidades.

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O tempo passou, o assunto não foi mais ventilado na academia. Em meados de 2022, bati-me em uma loja da Escariz, à venda, selado em embalagem plástica, com o livro “História Sucinta de Sergipe”. O autor era desconhecido para mim, Evande dos Santos.

Um livrinho de 184 página, da Fontenele se São Paulo, editado em abril de 2021.Comprei um exemplar.

Na reunião seguinte da ASL, cheio de entusiasmo, dei a notícia.

Ninguém demostrou surpresa ou entusiasmo com a novidade. Alguém  sabia quem era o autor, convivera com ele, fora professor em escolas públicas de Aracaju.

De qualquer modo, tínhamos agora a  história sucinta de Sergipe, a demanda seria atendida. .

Agora, fevereiro  de 2024, tentei localizar Evante. Seu livro está esgotado na Escariz e pessoas continuam procurando, querendo comprar. Ele poderia querer participar da comunidade de escritores sergipanos, rede social e academias.

Nem a Escariz que vende seu livro (soube que há ainda  um exemplar na loja do Riomar) pôde de informar o contato, como se o autor tivesse dado orientação para não se revelar seu contato.  

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Li meu exemplar e divulgo aqui a sucinta biografia que fiz dele.

A “História sucinta de Sergipe” começa com a posse da terra pelos portugueses, e prossegue com o início da colonização, o domínio holandês, a restauração do domínio português. Este segmento ocupa 25 páginas.

 

Em ordem, seguem o segundo segmento. capítulos curtos também, ocupando em torno 115 páginas:

A capitania no século XVIII;

O período colonial;

A emancipação política;

Sergipe no primeiro reinado;

Sergipe no período regencial:

A mudança da capital;

Sergipe no período imperial;

A primeira república em Sergipe;

O período getulista;

A tumultuada terceira república:

O regime militar;

A nova república.

Dentro de cada bloco de capítulos, onde o autor considerou que merecesse, há uma avaliação da cultura de então (fatos relevantes, figuras  proeminentes e outros aspectos). Com destaque para o capítulo final, “A cultura sergipana ao longo do século XX”, quando o autor chega aos artistas vivos que brilham agora em Sergipe.

Senti falta de um índice remissivo posto ao final que facilitaria a localização de temas e pessoas tratados.

Achei boa e útil leitura.

Aracaju, 24 de fevereiro de 2024, por Antônio FJ Saracura

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2024

LITURGIA DO OCASO, Francisco J. C. Dantas

 

LITURGIA DO OCASO, Francisco J. C. Dantas, editora Criação, 2023, 316 páginas, isbn 978-85-8413-441-0



O jornalista do Correio Matutino corre à Universidade Nutrição, fazer uma entrevista atrasada, adiada algumas vezes, com o magnífico reitor, doutor Severiano Colaço.

A universidade, que possui faculdades em todo o estado, está vivendo intensa campanha política, a atual diretoria luta pela reeleição, apesar de o Regimento não prever.

Agora é meio da tarde, na sala de recepção da reitoria. O jornalista chegou antes de começar o expediente e aguarda, sentado, impaciente. Três pró-reitores da instituição, figuras carimbadas, eminências pardas da reitoria, chefes da máfia dominante que interpretam as normas ao seu gosto, ocupam um sofá comprido e cochicham entre si, aguardando serem chamados para reunião agendada.

O reitor chegou cedo e está trancado em seu gabinete, ele sabe das visitas, as cozinha para mostrar poder, talvez.  

A secretária executiva, dona Rosaura, amiga de velhos tempos do jornalista, digita no computador, mexe em arquivos, confere documentos, mas se mantem atenta à vida em volta.

A porta da sala de recepção estremece.

Contra a luz, está chegando alguém. Dona Rosaura susta os afazeres e olha intrigada. O toc-toc de bengala no piso desperta a sala.

Os três pro-reitores, capazes de todas as vilezas, erguem-se, se inclinam de calcanhares unidos, sorridentes, dóceis, cavalheiros. E pensam juntos: “O que Ele vem fazer aqui, às vésperas de uma reeleição cheia de dificuldade. Precisamos descartá-lo.”

Dona Rosaura abre um sorriso curto, mas acolhedor, ante a figura octogenária, agora a sua frente, de doutor Moreira, ex-reitor da universidade e que a fez grande, criador do Hospital universitário Samaritano, que o dirige, benfeitor reconhecido do povo mais precisado, bastião da moralidade, voz  temida que se levanta contra os desmandos na Nutrição. Ele não tem hora marcada. Mesmo assim, dona Rosaura o conduz à ante sala vip da reitoria, não há como o mandar embora.

O jornalista sente que perdeu a vez, há gente importante demais na fila. Então, troca a entrevista por uma reportagem livre: “capto o que está em curso, puxo pela ideia, especulo, leio os sinais”.

Mais tarde, os três assessores são conduzidos ao gabinete do reitor. Já perto do final do expediente, dona Rosaura conduz também o doutor Moreira ao gabinete. E desta vez, ela não retorna. 

O jornalista tenta escutar algum ruído vindo da reunião. Teme pela vida do doutor Moreira. Nada escuta como se todos orassem baixinho. Impacienta-se e vai embora, já é tarde, precisa fechar a edição do jornal, que depende dele.  

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Assim nasce o novo romance de Francisco Dantas. 

Neste encontro, na sala de espera da Universidade Nutrição: um jornalista independente, um paladino da decência, uma secretária sem prestígio, mas atenta e um trio de picaretas engravatados, espertos e perigosos. E prossegue na sala da reitoria, onde acordos são fechados (à sorrelfa do paladino presente)... 

O livro é um libelo feroz que denuncia a picaretagem, o jogo de influência, o roubo descarado, o desgoverno nesta universidade pública contaminada (que muito ensina o que pouco serve). E se conclui nas mãos de Deus, pois não há quase mão sobrando (cem duvidosas e relutantes) cá embaixo.  

O autor (Francisco Dantas) passou a vida profissional dentro de uma Universidade, onde foi Justino Vieira em “Sob o Peso das Sombras” e onde, há mais de vinte anos, conheceu o reitor Colaço (como bem me lembrou o professor Reginaldo de Jesus, de quem nada escapa e leu “Liturgia do Ocaso” com religioso acuro); foi o professor que recusou a medalha pendurada numa  fita em “Moeda Vencida”. Criou personagens eternos em sua consistente obra, que viveram sagas sergipanas, mas deixou, nas mesmas, aqui e ali, rastilhos de pólvora espalhados, que se acendidos, explodirão os antros que roubam as verbas das universidades, das prefeituras das cidades, dos ministérios da nação. Roubam a nossa condição de ser uma nação digna. 

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Quando escuto ou leio uma história que me arrebata, ela me toma e eu crio novos caminhos e desdobramentos para melhor escapar das enrascadas, gozar  mais as delícias, fazer minha justiça particular para o bem ou  para o mal. Isso, desde quando ainda era um menino amarelo no sítio saracura. Eu e mais alguns que puxaram aos ferreiros das Flechas.

“Como não podíamos ter nada visível de que gostássemos, as nossas cabeças se enchiam de fantasias secretas.” (Página 156 do livro “Os Tabaréus  do Sitio Saracura”, 5. edição, 2019).

"Quando voltava das Flechas / Um mês inteiro passava / Contando os casos que vira / Ou então que inventava / E a gente de boca aberta / Interessada escutava...(Página 267 do livro “Os Tabaréus  do Sitio Saracura”, 5. edição, 2019).

Ao reler alguns livros do passado, me espanto com o sumiço de passagens nítidas vistas na primeira leitura.

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Antes que me meta em caminhos de onze varas, encerro aqui minha resenha da “Liturgia do ocaso”. Se tiver como, leia "Liturgia do ocaso" e toda obra do autor (dez grandes romances universais que falam de nossa gente).   

Quem, neste contexto, iria se interessar no castigo que dei, e como dei,  na corja suja e lisa  que rouba a nação.

(Por Antônio FJ Saracura, Aracaju 10 de fevereiro de 2024, revista em 06/03/2024).