segunda-feira, 29 de junho de 2020

O CICLO DOS SETE, a ascensão das entidades,Gabriel


O CICLO DOS SETE, a ascensão das entidades,Gabriel Machado Dias, Infographics, 2019 isbn 978-859-476-21-22


Parte I (em revisão) 

O mais importante em um livro é a sua construção. O autor, munido de poderes sobrenaturais, pode criar e destruir mundos tão reais, que os leitores viveriam ou morreriam neles satisfeito.

E foi isso que fez o garoto Gabriel Dias, com sua primeira obra, “O Ciclo dos Sete”, uma fantasia que narra o despertar, aparentemente terrível, dos sete Pecados Capitais, erradicados fisicamente do nosso meio (selados em tumbas subterrâneas) há sete mil anos. E o autor manipula, como perito matemático e químico esperto, a misteriosa magia, a força das famílias sagradas, a tecnologia futura, o heroísmo dos abnegados, a perseverança, a disciplina militar e a sorte que todos temos, sejamos quem formos...

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Uma gruta explode e a floresta em volta pega fogo. Gaile, menino ainda, procura, entre as cinzas, o pai e o irmão gêmeo, Vain, e toda a gente que estava na gruta no momento da explosão. Nem a polícia localizou qualquer vestígio depois.

O tempo passa...

Agora, Gaile é conceituado coronel da Guarda Real de Rogorod. Outra explosão misteriosa (que o envolve) deflagra o rumo do romance e Gaile parte com a missão suspeita de impedir que os Pecados Capitais despertem (se libertem) e retornem a ocupar a posição de destaque que desfrutaram antes de serem selados em urnas subterrâneas.

A trama se desenvolve em uma geografia complexa para quem chega de sopetão do mundo real, que foi o meu caso. Cortei campos, florestas, mares, grutas com nomes exóticos que não constavam em minha lembrança e nem em nenhum mapa de meu conhecimento. Junto com Gaile e um mago que apareceu, chamado Umbrior Kalahan, vivi e lutei em reinos e cidades singulares: Vyerm, Jetum, Menoik, Anmabion, Dilimandil, Ragarod, Kielgan... Palmilhei impérios (Famim, Menoikanos, Rebibas, Kamoti...) e estudei povos heroicos (humanos, Kamotis, Anões, Floonai, Keno, Nemedianos...).

Me encantei com a magia de Umbricor (parceiro na missão), com a arte futurista do professor Haki com seu cajado e com o protético reconstrutor de membros humanos, Barito, além da poderosa e articulada Lanin.

E fugi dos Ghuls, monstros que comem carne humana, meio parecidos com os Trolls do folclore escandinavo, que Tolken adotou.

E o povo, dizimado anonimamente e sem pena, produz tipos marcantes, como a esperta Maeli, que impede a ressurreição do Pecado Nartera da Inveja.

E há aquele aliado circunstancial, judas do time pecador, Iolong da Preguiça, que, vez por outra, dá um jeito de soltar uma dica (mas exige pagamento) e ajuda os mocinhos a cumprirem sua missão.
...
Como me fizeram falta plantas e tabelas semelhantes às elaboradas por JRR Tolkiem, em “O Senhor dos Anéis”.

E “O Ciclo dos Sete” conclui que a luta de Gaile e o sacrífico imenso de outros para impedir a libertação dos Pecados Capitais, fora inútil. Melhor tê-los convivendo com as Virtudes, cada um buscando angariar simpatia e adeptos. Nos sete séculos em que as Virtudes reinaram soberanas, incentivaram guerras contra “infiéis”, além de punirem pessoas por não seguirem as regras impostas. Se as Virtudes conseguirem eliminar, de vez, os Pecados terão poder absoluto, incontestável, eterno.

Parte II (para o autor)

(Por Antônio FJ Saracura, 2020jun26,na quarentena do Corona Virus).






sábado, 27 de junho de 2020

A GUERRA NÃO TEM ROSTO DE MULHER, Svetylana Aleksiévitch,


A GUERRA NÃO TEM ROSTO DE MULHER, Svetylana Aleksiévitch, 2016, Companhia das Letras,tradução do russo (Cecília Rosas), 390 páginas, isbn 978-85-359-2743-6


(Preâmbulo)

Livro de autoria da jornalista russa premiada com o Nobel de Literatura de 2015. É extensa e minuciosa reportagem construída com depoimentos de mulheres que lutaram na Segunda Guerra Mundial, em toda a Rússia. E que sobrevieram. A maioria na linha de frente: dirigindo tanques, Snipes laureadas, na infantaria, enfermeiras, médicas, telefonistas, espiãs, engenheiras, seguranças, cozinheiras, costureiras...

Muitas nem voltaram para casa, outras retornaram inválidas, outras traumatizadas. Boa parte retornou com o peito coberta de medalhas pelo heroísmo em campo. E, depois, com a paz, amoleceram o coração e foram mães; tiveram e criaram filhos para repovoar a Rússia devastada.

Os alemães chegaram ao em nossos lares, matando, inclusive os que rendiam. Como suprir as fileiras? As mulheres faziam questão de ir para o front defender a pátria, expulsar os invasores e, depois, devolvê-los à suas casas na Alemanha.

Um exército de saias, espetacular.

A autora fala do caminho percorrido para compor a obra: “Segui a pista da vida interior, fiz anotações na alma. O caminho da alma é mais importante do que o acontecimento. E não foi fácil penetrar em suas almas. Ah minha querida, já se passaram quarenta anos, mas na minha casa você não encontra nada vermelho. Desde a guerra, eu odeio vermelho’”

(Fala das guerreiras)
“Depois da sessão de tiros, fizemos o treinamento de camuflagem. O coronel veio inspecionar e parou sobre um montinho. Não se via nada. As meninas estavam bem escondidas. E aí, o montinho começou, embaixo dele, a implorar: ai, camarada coronel, eu não aguento, o senhor é muito pesado! O montinho era uma menina camuflada.”

“Quem esteve na guerra sabe que um civil se transforma em militar em apenas três dias.”

”Ratos saíam correndo da cidade para o campo antes dos bombardeios; eles farejavam a morte vindo.”.

“Naquela fase da guerra não havia armas suficientes. Davam pra gente duas ou três granadas e nos mandavam para o combate sem metralhadoras; íamos para o combate como quem vai para uma briga com a vizinha. A gente pegava fuzil, na batalha, de algum soldado morto.”

“Passávamos muita fome. Se dormíamos, sonhávamos com comida. Eu sonhava com bisnagas de pão voando sobre mim.”

“Fazia tanto frio que os passarinhos caíam no voo, congelados. Havia um soldado ainda menino que tinha uma lágrima congelada no rosto.”

“Havíamos nos transformado em dois bastões de gelo; não conseguíamos nos mover. Ficámos em pé nos apoiando uma na outra para não cair, para não nos partirmos em pedacinhos.”

“E como pesavam os feridos no inverno! Eles ficaram duros como cadáveres, enganavam a gente como se estivessem mortos.”

“Pergunte para mim o que é felicidade. Eu respondo que talvez seja encontrar entre os mortos, uma pessoa viva.”

 “Ele está morrendo e mesmo assim não acredita que esteja morrendo. E depois de morto, fica no rosto um espanto: é possível que eu tenha morrido?”

“O oficial soviético não podia se entregar ao exército alemão. Se o fizesse, era desertor. Se o libertássemos, seria julgado e condenado.”

“Eu me lembro de um soldado alemão ferido, que agarrava a terra com a mão. Nosso soldado então falou pra ele: não mexa nessa terra que é minha; a sua ficou lá de onde você veio.”

“Todos queríamos viver até a vitória.”

“Somos de uma geração que acreditava que há coisas maiores do que a vida humana.”

“Casa é algo muito maior do que as pessoas que moram dentro, é maior do que a própria casa. É uma coisa. As pessoas precisam ter uma casa...”

“Acabada a guerra, quando cheguei em casa, meu irmão me mostrou minha certidão de óbito. O Exército russo havia me enterrado.”

“Antes da guerra tínhamos tantos rouxinóis! Depois eles sumiram com a terra tão revirada que veio à tona o esterco de nossos avós. Só retornaram muito depois de ararmos a terra mais de umas vez.”

“O amor é o único acontecimento pessoal da guerra. Tudo o mais é coletivo. Até a morte.”

(Conclusão)
Quase um milhão de mulheres russas lutou na Segunda Guerra Mundial. A autora ouviu centenas das que sobreviveram. Trouxe-nos pedaços das almas dessas mulheres que viveram situações extremas no treinamento, nas batalhas, até depois que retornaram para suas casas e famílias destruídas.  

Enfadei-me, algumas vezes. Os casos contados pareciam recorrentes, as mesmas dores sempre.
Mesmo únicos e terríveis para quem morreu ou para quem esteve junto, os casos são dourados por quem conta, amenizados.  A própria personagem (a mulher russa que lutou) não conseguiria recompor os seus casos com todas as cores da dor sentida no passado. Névoas de lirismo, de mágoa, de defesas, de esquecimento desejado já os contaminaram.

Muito menos a jornalista que o ouviu assim; e mais ainda eu, leitor de outro mundo, que nem uma guerra vi..

“A Guerra não rosto de mulher” é um livro que nos faz pensar como a paz precisa ser preservada a qualquer custo.


(Aracaju, 2020jun27, Antônio FJ Saracura)

terça-feira, 9 de junho de 2020

VIVÊNCIAS SOBRENATURAIS E OUTROS CASOS,


VIVÊNCIAS SOBRENATURAIS E OUTROS CASOS, Salete Nascimento,2016, Infographics, 206p, isbn 978-86-9476-0006-7



(novo estilo de resenhas)

Salete é poeta de cordel e poeta clássica de valor reconhecido. E prosista de primeira, haja vista o livro que tenho nas mãos e que se chama: Vivências Sobrenaturais...
Ai que medo!
Ela é dorense do Gado Bravo Norte, nasceu lá, e fundou a Academia Dorense de Letras. Ela é estanciana, viveu e trabalhou lá, onde fundou o clube do Poeta e a Academia Estanciana de Letras.

O livro Vivências Sobrenaturais deixará o leitor de sobressalto.

E eu vou viajar por ele.
E preciso atravessar, em silêncio, as noites lúgubres sob a luz mortiça de um candeeiro a querosene...

E se o candeeiro se apagar?
E se escutar gemidos de lamúria?
Eu pensei que era de dia. Quero não!
Só vou, se não tiver jeito mesmo.
Dessa vez tenho que ir porque assumi o compromisso com a autora que é minha amiga e não posso faltar.
Vou com os cabelos arrepiados, que Deus me proteja.
Aqui pra nós, eu gosto do pavor. Ele me espanta e me encanta.
Venha, você, comigo, seu espantado! Pra eu não não me encantar sozinho!

Vamos morrer de medo com as histórias assombrosas nas quais Salete encheu pingos de sangue e gritos de medo:
A santa cruz mal assombrada;
A pavorosa morte de morte do senhor Maneca;
O Curupira;
A Mortalha;
O Saci Pererê;
A Mula sem Cabeça;
O azar da Botija;
O carneiro encantado;
O homem Saco;
O Cemitério da Cruz Vermelha;
Um pai criminoso e suicida;

É muito?

Pois saiba que tem muito mais ainda. São vinte e três gritos de socorro. 
O livro é uma antologia. Todos os gritos foram ouvidos por Salete desde quando era menina.

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Hoje à noite eu vou dormir na cama de mamãe...
Como você me acompanhou em cada arrepio, e eu sei que gostou, corra pra cama da empregada, que também é fofinha.
E mande seus amigos comprarem (melhor pelo dia) o livro de Salete, que está à venda na Livraria Escariz  em Aracaju.  Se acabou o estoque da Escariz... mande-a telefonar para Salete e a autora fará a entrega pessoalmente. 

(Por Antônio Saracura, Aracaju 09 de junho de 2020)