domingo, 29 de maio de 2016

O AJUTORO, Antônio de Oliveira Silva (Virman),

O AJUTORO, Antônio de Oliveira Silva (Virman), 2009, InfoGraphics,80p,Isbn: Não catalogado



Virman (pseudônimo literário de Antônio de Oliveira Silva) mora em Tobias Barreto.  E é lá, no seu recanto, que, nas horas vagas, produz literatura.



O que faz com uma pessoa comum compor poemas, contos, crônicas, romances, peças teatrais. E publicar livros?  E investir recursos próprios (sempre escassos) em algo que, além de não garantir retorno financeiro, pode ser ignorado pelo mercado? E, quem sabe, até provocar ciúmes   dos que se sentem donos do saber?



Como Virman, há muitos. Como meu conterrâneo de Itabaiana, Antônio Oliveira, (quase homônimo de Virman), que já se foi para o céu. Consertava bicicletas e escrevia (publicou o espetacular “HISTÓRIA Secreta de uma Paixão”), e como Antônio Saracura (que sou eu e carrego oculto o Oliveira de minha mãe). Para citar apenas três.

Desígnio de Deus?

Conheci Virman na Bienal de Itabaiana em 29.11.2011. Como soe acontecer quando chego a um evento, procurei reconhecer cada pessoa que minha vista alcançava. E vi um senhor circunspecto sentado atento, ouvindo a palestra que Luiz Antônio Barreto proferia.  E havia um lugar vazio ao seu lado. E eu precisava logo sentar-me e ouvir Luiz discorrer sobre sua missão ciclópica de despertar o nosso povo para a cultura.

Andei até a cadeira vazia e sentei-me ao lado do senhor circunspecto, tendo antes retirado dois livros que ali descansavam. Olhei para o dito vizinho (os livros só podiam ser dele) e tentei entregar-lhes. Ele os recusou com a mão e, sussurrando, me disse que os livros eram meus.  E mostrou-me a primeira página de ambos, havia uma dedicatória para mim, assinada por Virmam.  

Era então o meu dileto leitor que, dias antes, mandara-me um email falando bem de meu livro “Meninos que não queriam ser padres”.  E que publicara, no último número da revista “Perfil” artigo (E  AÍ?), de uma página inteira, ratificando seus pontos de vista.

   Xxx

Acabei de ler “Ajutoro” e estou bebendo, gota a gota, os poemas do segundo livro, se bem que poesia sempre me soa algo muito particular e misterioso. Salvo poucas exceções.

O “Ajutoro” foi uma grata surpresa, apesar de escrita no dialeto tabaronês. É uma peça de teatro ambientada na zona rural de Tobias Barreto, Sergipe, onde os personagens discorrem variados temas de interesse comum, como globalização, política, movimentos sociais, capitalismo, costumes, etc.  No baixar do pano, prega uma peça em Chico Bode (um dos personagens) que me fez explodir em mais uma gargalhada gostosa.

“Ajutoro” já merecia ter sido traduzida para outras línguas (português inclusive) e assim ganhar visto universal, que merece. Para tanto, sugiro que a próxima edição seja bilíngue, onde o original tabaronês corra ao lado de um texto em português, para que seja melhor entendido pelos esquecidos das orígens.

(publicada na Perfil 15/02)

POESIA E PENSAMENTO, João Lover,

POESIA E PENSAMENTO, João Lover, Infographics 186p; 21cm,2013, isbn 978-85-916182-0-0




Este é o quarto livro de poesias de João Lover, sinal claro  de que tem agradado aos leitores. Nenhum autor, por melhor que seja, resiste ao silêncio absoluto dos leitores. Um livro, uma peça de teatro, uma canção e outras expressões do belo são produzidos para o público. Se não enlevam, o público os ignora (muitas vezes nem reclama) e afasta-se. Resta ao autor, numa contrapartida justa, depois de entender o duro cenário, resignar-se e procurar outro afazer.


Conheço João Lover de pouco tempo, mas suficiente para saber da consciência que tem sobre o valor de sua arte. E briga por ela, para que seja lida, pois julga que vale a pena. Na II Bienal do livro de Itabaiana, que aconteceu em outubro de 2013, na qual lançou este livro, encontrei-o cuspindo maribondos, pois mandaram parar a recitação que fazia a uma pequena plateia, num dos corredores. O governador chegava para uma visita. Mandaram parar, como se recitar poemas fosse inadequado à presença de uma autoridade em uma Bienal de livros!  Acolhi alguns daqueles maribondos, multipliquei-os na minha usina. Mais adiante, cuspi um enxame inteiro. Eles zoam ainda dentro de mim, querendo morder os que envergonham a literatura ao se envergonharem dela.

Sinto algo diferente na poesia de João Lover. Seus poemas parecem duros,  diretos:  “Pau, cacete, madeira de quina de sucupira, por cima dessa moleira”. Posso estar equivocado (o que não é de estranhar), mas sinto-os como prédios no concreto bruto, estruturas formidáveis porem desnudas de aviamentos. O valor está à mostra, evidente, não cabe suposições. Como a mulher nua na exuberância das suas formas, desprovida dos adornos que lhe permitem o acesso aos salões sociais e que a fazem menos bela na sua essência.
Usando o pensamento do próprio autor, digo que os poemas de João são flechas de letras-luzes disparadas por um visionário que carrega as cruzes da arte. Os poemas têm o lirismo romântico, mas sem lero-leros: “passar dez minutos de amor com ela vale mais do que a vida inteira sem amar ninguém” ou “teu sorriso por um segundo é a beleza do mundo”.  Ou quando canta a amada: “Vejo esse jeito que tens e penso em mais de cem coisas para fazer: uma vontade de morder, outra de abraçar...”

Precisa de mais? 
Leia o livro!

O arrulhar de um livro sendo lido, motiva o poeta a escrever e publicar novos poemas. 
E assim, a vida ficará melhor para todos.

(Publicada na revista  Perfil 17/4)
(Resenha escrita em 2013)


O VENDEDOR DE SEREIAS, Robério Santos




O VENDEDOR DE SEREIAS, Robério Santos, InfoGraphics,150 pág,21cm,2011,Isbn 978-85-911889-0-1



O título instiga!

Deve ser um livro policial!
Mistérios, perseguições, crimes...


Antevejo o gordo Smiley, andando pelos cantos escuros de Itabaiana, acompanhado de perto por um Robério sorrateiro após dar um nó em Jonh le Carré.

Carrego um trauma de não ter engolido adequadamente “Ulisses” de James Joyce e “O Evangelho Segundo Jesus Cristo” de Saramago. Fiz algumas tentativas de dominá-los, mas tive que desistir. Eles foram muito mais fortes do que eu, ou melhor, do que minha capacidade de entender. Aconteceu também com “Os Sertões” de Euclides da Cunha, este quando era ainda adolescente. Não consegui andar pelos chãos cascudos do sertão nordestino adequadamente. Retrocedi alguns quilômetros e muni-me de um dicionário, avancei devagar. Quando cheguei ao Homem e à Guerra, a Terra já não era a mesma inóspita e, ao final do livro, até faria uma rocinha nela, se conseguisse comprar lá um sitiozinho de final de semana. “Zumadunu”, de Airton Lócio, é outro livro (este sergipano) que me venceu, mandou-me embora antes do meio. Considero um trauma, porque os livros acima são clássicos ou estão expostos nas gôndolas das livrarias da cidade. Para receber a marca de clássico é preciso impor-se. Por outro lado, nenhum livreiro manteria um livro ocupando um local assim tão nobre se não prestasse, contaminaria os vizinhos, recomendaria mal a loja.

O peixeiro Felipe, com banca estabelecida na feira de Itabaiana, fica rico, muito rápido. Ligeiro demais para o gosto do detetive Mário Sal (delegado aposentado compulsoriamente por problemas mentais), que declara odiar “quem fica rico de um dia para a noite”. Vige!

Mas, em vez de Mário Sal cuidar de suas obrigações “profissionais”, esclarecendo o mistério do enriquecimento talvez ilícito, resolve contar seus podres ao leitor atônito, que estava muito mais a fim de ação. O provável contraventor (Vendedor de Sereias) é mantido em um segundo plano confortável, para desespero dos meninos de rua, das prostitutas, dos homossexuais, dos mendigos, dos poetas em busca da rima certa, dos ricardões retardatários...

Cuidado, Itabaiana!

E então chega à cidade, saído direto do “Silêncio dos Inocentes”, doutor Hanibal Lecter (disfarçado no italiano Bach). Ou o próprio Anthony Hopkins em pessoa, não consigo separar um do outro. Deve ter sentido o cheiro da sua iguaria preferida.

O detetive continua tresvariando sobre a cultura universal, desde o poeta Mário Jorge até as teias de aranhas (seriam viúvas negras?) de psiquiatras (ou psicopatas?) célebres. O negócio do peixeiro deslancha, deixando-o ainda mais rico.  E eu, cada vez mais agoniado...

Minha agonia começou logo na página 45   com “Alguns Sonhos e Inverdades” indo até a “Coragem Extrema e Final” (página 141) se bem que vivi (não vou negar) momentos inesquecíveis, com “um calcanhar sendo desprendido da janela” (bonito e sádico) e com o beijo da “briba” albina (romântico e trágico): Pérolas puras!

Robério Santos (poeta, fotógrafo, cineasta, jornalista, revolucionário, professor, imortal da Academia Itabaianense de Letras... Ufa!) saiu com a câmera na mão, à La Glauber, captando o mundo fora e dentro de seu detetive maluco (e de outros alter egos), sem pena da gente, deixando-nos à mercê dos dentes afiados de Lecter e da peixeira mais amolada ainda de Felipe.  

Há livros que nos conduzem pela superfícies, outros pelas profundezas e outros (como este) oscilam entre uma e outra, um turbilhão, matando seres de guelras ou de pulmões. Parece um poema, daqueles misteriosos que pouca gente consegue aspirar todo o perfume.

O Vendedor de Sereias é uma história intrigante, macabra, profunda, maluca.

Li duas vezes o livro inteiro e, algumas partes, muito mais vezes. Foi dureza, mas, ao final de tudo,   senti-me gratificado, pelo conjunto da obra.

(Resenha escrita em 2011, quando o livro foi lançado).

Obs:

Tenho lido nas redes sociais que O Vendedor de Sereis virou filme, estará nos cinemas (youtube) logo, logo.

(fim da resenha)

xxx

ANOTAÇÕES FEITAS 03 DE ABRIL DE 2011 QUE SUBSIDIARAM A RESENHA ACIMA (agora,  em 31 de maio de 2019, resolvi apendar aqui, para não as perder).

Ao Robério Santos (retorno)

Sinto que você tem uma cultura mais livre, mais insubordinada além de mais profunda do que a que acho que possuo. Terei que me acostumar, ou melhor, que aprender a entendê-la.
Tecerei ligeiras impressões sobre os quatro textos que tenho à mão de sua autoria.

1)      ADELARDO

Muito bom. Apenas acho que se trata de uma reportagem (ou crônica). Pelo que me parece, não é conto. Pelo menos, da maneira que vejo o conto. Mas eu não sou especialista no assunto.

2)      CONTO CUM –

Entrou em casa rapidamente, abraçou seu marido. Eles fizeram amor pela primeira vez ao som dos sapos, grilos e luz de candeeiro. O mundo havia entrado no eixo”.

Acho que deveria terminar ai em “NO EIXO”. Mesmo assim, sofri com o estilo, fora do que estou acostumado. O texto final, após esse ponto (Nove meses depois, final de 1909 nasceu José Vieira. José Vieira casa com Enedina...) pareceu-me mais uma anotação para não esquecer depois, um adendo que prejudica o fim glorioso da narração. Só acho, não tenho certeza! Afora os pequenos erros (talvez de digitação)...

3)     O JUMENTO

O começo é erudito demais, chega ficou meio cansativo. O fim (End) me pareceu meio forçado, quiçá inverossímil. Que terreno pequeno é esse? Existe? Você tem um jeito peculiar de contar as coisas que me deixa meio desorientado.


4)     O VENDEDOR DE SEREIAS


Acabei de ler pela segunda vez. Confesso que na primeira quase bato pino quando você entrou dentro de Mário Sal (ou ele mesmo entrou dentro dele, com o seu consentimento) com os desvarios para os quais não estava preparado, como ainda não estou. Se bem que, lá na história da largartixa e do pulo do 10 andar eu gostei. Acho que tem muita poesia, se bem que sádica (lagartixa) e macabra (10 andar). A segunda leitura me fez andar mais maneiro, se bem que ainda sofri sobressaltos, fiquei perdido e talvez aconteça o mesmo com boa parte dos seus leitores.

Há livros que nos levam pelas superfícies, outros pelas profundezas das águas e outros (como este) nos puxam para baixo e nos empurram para cima, quase nos matando, tenhamos pulmão ou guelras. Eu ainda estou me debatendo, tentando entender o que  todo o miolo do texto (da página 45 até a 136) tem com o “Vendedor de Sereias”.  Espero que não tenha sido apenas para dar corpo ao livro, como Sal diz na página 59. Se foi, achei um corpo estranho! Um corpo estranho mas sem deixar de ser instigante, maluco, tipo Raul Seixas ou Mário Jorge (parece que era também). Um corpo que precisa ser dissecado para me deixar em paz. Por fim, seu livro transita em atmosferas para as quais ainda não estou pronto para respirar sem aparelho. Meio doidas, conforme você mesmo diz em alguns lugares.

PS:
Bem, meu amigo... O que escrevi acima é de foro privado. É que me senti na obrigação de dar-lhe algum feedback em vista da gentileza que tem me dispensado. 
Um grande abraço,
Antônio Saracura (03.04.2011).


xxx 


O vendedor de Sereias
(rascunho de uma resenha preliminar escrito em março ou abril de 2011). 


Carrego um trauma comigo de não ter engolido adequadamente “Ulisses” de James Joyce e “O Evangelho Segundo Jesus Cristo”  de  Saramago. Fiz algumas tentativas de dominá-los, mas tive que desistir. Eles foram muito mais fortes do que eu, ou melhor, do que minha capacidade de entender. Aconteceu também com “Os Sertões” de Euclides da Cunha, este quando era ainda adolescente. Não consegui andar pelos chãos cascudos do sertão nordestino adequadamente. Retrocedi alguns passos e muni-me de um dicionário, avancei devagar. E para minha incomensurável satisfação cheguei fagueiro à Guerra e ao Homem. E então, acolhi a terra como minha por conhecê-la agora.

Não quero igualar aqui o livro de Rogério Santos aos três tesouros citados. Está em pauta a minha incapacidade de deglutir, do que poderia enumerar testemunhas nem tão célebres, como “Zumadunu”, de Airton Lócio, e alguns autores de livros repetitivos de “auto-ajuda”.

Rogério tinha um roteiro (Fillipe) e saiu com a câmara da mão, à La Glauber Rocha, captando o mundo fora e dentro dele (e de alguns alter-egos), nem ligando para os leitores medíocres, como eu, que mesmo correndo, mesmo voando, mesmo prestando a maior atenção, perde-se a cada página. Entrei em parafuso (parte III) quando o enredo passou para o mundo dos sonhos, dos desvarios, dos desejos, das vaidades, da interação comigo, a essa hora já enraivado e querendo voltar para casa. Pode até ser presepada de gênio, e deve ser mesmo. Com certeza é, pois me pareceu um nível dos grandes poetas de minha terra, desorientando-me com seus enigmas, para o que só escuto aplauso.

É um livro interessante, mas que o leitor tem que aprender a ler e querer gostar dele. Se não pode abandoá-lo logo no inicio da parte III (alguns sonhos e inverdades, prólogo dentro do prólogo), quando o personagem louco ou sem juízo nenhum  (só pode ser!) dana-se a pintar telas abstratas com um pincel desgovernado. Neste ponto é que o livro quebra de vez o comportamento prometido e solta, de vez, a franga e todo o galinheiro. Puro desvario. Um vômito antes da ingestão (muito antes da digestão, como cita em algum lugar). O autor abandonou a história e enlouqueceu aqui à minha frente, que sou um leitor comprometido. “Que coisa!”  E causa repulsa o que diz na página 59 (etapa final) a deslealdade em aproveitar escritos que nada tem a ver com a história, apenas para dar corpo ao livro. E jogo do nascimento de Jesus Cristo, só faltando o aparecimento dos Ries magos. Mas talvez fosse o fedorendo, pela gosma esverdeada vomitada  e pela necessidade de ser eliminado aos sete anos. Fosse um ou outro, para nada serviu, nem como mensageiro da boa ou da má nova.  E introduz Mário Jorge Vieira (esperei Raul Seixas de braços dados com Paulo Coelho navegando num caule de maconha. O outro ego de Robério  transita maluco da página 15 a 109, passando aqui a falar de coisas mais doces, como a lagartixa degolada ou o amigo voador. Tocaram-me pela beleza trágica e sádicos os capítulos  15 e 20. E no 21 volta de novo o teto rachado de Paes Leme. Até o capítulo a página 139 pouca coisa o leitor menos doido consegue absorver. As sete folhas finais conclui a novela do vendedor de sereias na feira de Itabaiana, abandonada na página 59.

Para dizer que o personagem (Mário Sal) era perturbado bastava uma frase (acho!).
O ENFP (quem sou eu?) ficou tedioso, até agressivo, para os que não são iniciados em Carl Gustv Jong. Aparentemente (para os menos eruditos) este texto nada tem a ver com o tema do livro. O texto revela Mário ou Robério? Pode ter dado corpo ao livro, mas corpo estranho, que dificuldade o entendimento do leitor comum.

Depois de quase soçobrar no turbilhão do sonho de Herminiano (página 47, que comentei no parágrafo anterior), as estradas seguintes ficaram mais maneiras e até muito bonito e trágico, como o 15 com o poema da lagartixa, e muito bonitas e sádicos como o capitulo 20 e o filme insólito do amigo desde o calcanhar sumindo no patamar da janela até o monte de fatos na rua. Até o capitulo 20, onde o sonho de Emiliano é recontado com o mesmo texto, agora muito mais amigável. Se bem que continua provocando leitores bem comportados (como eu) pois veja o nascimento do menino Jesus ao avesso, não serviu para nada depois. E em algumas horas, ainda me confundi se não era Robério que falava no lugar de policial esquizofrênico (?) Mário Sal. Os capítulos curtos facilitam a leitura, as citações de clássicos amenizam muito as feridas, como a (dispensável) pedrada no alto da colina, que bem poderia não ter sido escrita.

Confesso que andei meu perdido na primeira leitura. E na segunda, um pouco menos, mas perdido também. Era essa a intenção?

Para escrever sobre esse livro prefiro dizer que a prosa de Robério é um poema, daqueles poemas misteriosos que pouca gente consegue aspirar todo o perfume. Para escrever-se sobre O Vendedor de Sereias precisava de um livro até maior do que ele.



 Antônio Saracura  




sexta-feira, 20 de maio de 2016

ITABAIANA, NOSSO LUGAR (QUATRO SÉCULOS DEPOIS), José de Almeida Bispo






ITABAIANA, NOSSO LUGAR (QUATRO SÉCULOS DEPOIS), José de Almeida Bispo,Infographics,268 páginas,ISBN: 978-85-916224-0-5



Senti uma dorzinha ao ler: as serras que coroam a cabeça de Itabaiana não lhes pertence, foram entregues como dote aos municípios emancipados, como se fossem terras inúteis, nas quais não frutificava a boa agricultura.

O leitor pode me questionar:  Se as serras existem, dominam a terra e o céu (que são de todos) por que você faz questão delas? Ora! Vou explicitar... 

Se já eram nossas, estavam na linha delimitadora, por que não ficaram do lado de cá? Não fariam falta aos municípios descendentes, que antes não tinham nada, eram simples povoados e ganhavam de graça a emancipação política.
E não foram apenas as serras! 


Como pode Cova da Onça (principalmente ela), Candeias, Capunga e Serra do Machado, sítios maiores de nossa história, ficar no outro lado da fronteira?  Cheira a vingança de político despeitado ou sujeira no teodolito do engenheiro agrimensor.

O autor dessas revelações (José de Almeida Bispo em seu belo livro Itabaiana, Nosso Lugar...) também não segura as lágrimas, eu percebi lendo suas frases. E mais gente não chora também, somente porque nem sabe ou nem liga para essas coisas bestas.

Sempre Itabaiana me pareceu uma cidade ímpar, um tentador farol ao tabaréu do sítio, gloriosa a vida toda, com um destino brilhante e um passado heroico.  Mas não foi (ou não é) bem assim. Miséria e crimes (que continuam). Os meus heróis não passaram de déspotas interesseiros.  Itabaiana não é mais do que um lugar comum.

Foi a impressão que a leitura de Itabaiana Nosso Lugar... me deixou. A verdade dói, mas precisa ser restabelecida.  E agradeço por esse momento de realidade (a incontestável história sagrada revelada pelo autor, um responsável e respeitado historiador) que sacoleja a eterna fantasia, que certamente voltará a me inundar.

“Itabaiana Nosso Lugar” é um belo, sério e grande livro, nas dimensões, no volume de informações lastreadas de boas fontes, informações claras e didaticamente ordenadas. Opiniões comedidas, fotografias em profusão. Um livro indispensável para estudiosos de história e para aprendizes na escola. Leitura indispensável a todos nós, desde velhos conterrâneos que tentando adivinhar o passado, até o menino de dentes de leite.

Os anexos, especialmente (porque me sensibilizam muito) os que tratam de personagens de destaque, dos mutirões, das festas populares, dos costumes de antanho, das lendas, merecem ser lidos muitas vezes.  E o mapa do município com seus povoados e acidentes da geografia (do qual já me utilizei em outras oportunidades) merece ser emoldurado e envidraçado para ornamentar cada varanda das casas dos filhos da velha loba (Sebrão, Sobrinho), Itabaiana Grande.

(Publicada na revista Perfil,  ano 17 número 1, escrita em 2013)


Post scriptum (em 20/052016):


O autor, José de Almeida Bispo, é um pesquisador incansável e já produziu (e vem produzindo) vídeos encantadores sobre nossa terra, que já assisti, embevecido e cheio de patriotismo:



História do tempo dos Vaqueiros (episódio 01);

Tempos de Lendas e Tesouros (episódio 02);

Doces Vales de Sonhos (episódio 03);

Sina de Estradeiro (episódio 04);

Vida Cigana (episódio 05).





Toda obra de José de Almeida Bispo pode ser comprada na livraria itinerante do professor Taurino, que fixa âncoras nos dias de feira em Itabaiana, no calçadão da sorveteria Kiola, na ruazinha que leva à rádio Princesa da Serra AM. Taurino também tem o que se de produz melhor em Itabaiana e em Sergipe, inclusive os últimos lançamentos de Antônio Saracura.
Imperdíveis!  Também os livros de Saracura! A todos, sejam de Itabaiana ou do resto do mundo, que apreciam o que é bom.





 


ITABAIANA GRANDE SEUS CAUSOS E MAIS, José Augusto Machado Baldock

ITABAIANA GRANDE SEUS CAUSOS E MAIS, José Augusto Machado Baldock, Aracaju, Infographics, 2013, 142pag, isbn 978-85-915164-0-7



Itabaiana está publicando livros a todo vapor (meados de 2013). Robério Santos (o irrequieto e brilhante fotógrafo, jornalista, cronista, romancista, editor e muito mais) publicou “Lampião e Volta Seca em Itabaiana”, de que falamos (rapidamente) na última edição. Anderson Almeida (Todo Leme a Bombordo), Arisilda Melo (Coletânea da Alma), Carlos Mendonça (Amor de Mãe), Ismael Moura (Experiências com Deus), Antônio Saracura (Tambores da Terra Vermelha), para citar alguns que me vêm à mente.

Além de José Augusto Machado Baldock “Itabaiana Grande – seus causos e mais”, lançado em uma bonita festa no dia 14 de agosto (2013), na praça Chiara Lubich.

Todos esses livros estarão na II Bienal do Livro em Itabaiana (17, 18 e 19 de outubro, 2013, próximo).

Outros autores itabaianenses têm livros no prelo e vão levar também à Bienal. Essa Bienal (preciso informar) venderá livros de todo escritor (entenda como um veemente convite) de qualquer nação que possa comparecer à Itabaiana (não perca por nada!).

Sobre o livro “Itabaiana Grande – Seus casos e mais”, reproduzo uns rabiscos que garatujei e que o autor fez publicar na contracapa do livro, o que muito me honrou:

O bom contador de histórias está de volta, resgatando nosso passado. Tive o privilégio de passar os olhos pelos originais do novo livro de José Augusto Machado – Baldock... sem os acabamentos finais, vindos direto da digitação, com algumas palavras truncadas, outras repetidas ou omitidas. Mesmo assim, o livro é um prato cheio de saborosas iguarias. Por que eu iria perder tempo com mosquitos zoando quando o mel flui logo ali na palavra seguinte? O jeito de ser “itabaianês”, que muito nos distingue, mais uma vez é caracterizado pela pena esperta de Baldock.

Armilindo Carpinteiro (um dos personagens) resolve com galhardia seu problema financeiro, convencendo as duas “esposas” a habitarem na mesma casa. Passa a fazer uma única feira, pagar um só aluguel, e a “agradar” melhor à ambas...não precisam esperar sua visita, pois ele está sempre pertinho, dentro de casa...  
Quem assistiu o filme “A Freira Devassa” no cineminha de Arrojado?
O Testamento de João Marcelo ressuscita meio cemitério das Almas e todo o Rumo; muitos de minha família; Cada morto-vivo é biografado como manda a moderna historiografia...

É um livro rústico, mas rico.

Para ser lido em manga de camisa, numa rede na varanda, sem outro compromisso marcado.
Contente-se com a emoção de brota, sorria sem medo! As histórias cativam tanto, que, se escritas em russo, eu daria um jeito de entendê-las. 

(Antônio Saracura, Aracaju 26 de maio de 2013, recuperada em novembro de 2020).

Obs: O texto em itálico está na contra capa do livro impresso. Uma honra para mim.

Meu livro “Os Curadores de Cobra de Gente”, editado em 2017, presta uma homenagem à literatura baldokeana, recontando algumas de suas melhores histórias em cordel.

Leia os dois!


Obs: em 27/03/22 deletei outra postagem deste livro  colocada por equívoco meu (com 32 visualizações  

HISTÓRIA E CULTURA DE ITABAIANA CONTADA EM VERSOS, Ednalva Barros Tavares

HISTÓRIA E CULTURA DE ITABAIANA CONTADA EM VERSOS, Ednalva Barros Tavares,páginas: 100, 21cm, Infographics,2011,isbn: 978-85-912553-0-6



Como é difícil publicar livros! 


Muito dinheiro público é aplicado em trios elétricos com suas loiras oxigenadas e cacarejantes, produzido fugaz noite de ilusão e ruído. Quase nenhum dinheiro é gasto em literatura, e um livro custa bem menos e dura uma eternidade de sossego... 

Está acontecendo em Itabaiana um rebuliço cultural. Agora é meados de 2011, por aí. Dois historiadores, Wanderlei Menezes e José de Almeida Bispo, estão com livros prontos para publicar. Robério Santos, depois do “Vendedor de Sereias”, acaba de lançar  a biografia de Joãozinho Retratista. De Robério circula uma revista que vale muitos livros (Omnia), fruto de particular empenho. Há livros de poesia circulando ainda quentes e outros no forno das editoras. Há ainda Vladimir Carvalho, Ismael Moura, Antônio Samarone, José Rivas, Luciano Correia e muito mais. E a revista Perfil, que abençoa mensalmente tudo isso! Até eu, um bugre tosco, depois de “Os Tabaréus do Sítio Saracura” e “Meninos que não Queriam ser Padres”, aguardo, roendo as unhas, que o Estado cumpra a palavra (prêmio Mário Cabral) e publique “Minha Querida Aracaju Aflita”.

Está nas livrarias e nas mãos dos leitores a “História e Cultura de Itabaiana Contada em Versos”, da professora Ednalva Barros dos Santos. A poetisa é nascida e criada no povoado Lagoa do Líbano (recende pura poesia), que fica junto das Flechas e Bastião  (meus ditosos pagos).

Viva a Deus!  
Vibro quando o livro trata de nossos costumes. Por que cantarmos os pirilampos dos outros quando a nossa lua é muito mais bonita?  
Viva a Deus também porque o poder público tirou o cascacel do bolso e publicou o livro da professora Ednalva. Será? Ledo engano! A edição foi custeada por uma comissão de mecenas, conforme reza a contra capa.

Sobre a autora?
Vive o magistério, na rede pública do município. É pedagoga com pós graduações e, atualmente, é a diretora (e professora) da escola do Boqueirão, mas já passou por Taperinha, Pé do Veado, Bastião, Cabeça do Russo, Bananeiras, Miguel Teles... Bateu a coxia!

Sobre o livro?
São irrelevantes os pequenos senões, diante do que tem de bom. Senti pelos versos que estouraram métrica e música, e pelas estrofes que incharam sem precisão. 
Como se poesia precisasse de regras!  
E pela segunda pessoa alienígena e algumas discordâncias, como a do próprio título...
Como se poeta precisasse desses purismos!  
Por que estou aqui apontando falhas, se meus escritos são eivados de erros facilmente evitáveis? 
Vá lá se entender a natureza humana! 

O que vale é que a nossa cultura está muito mais rica agora com a obra da professora Ednalva.

(publicada na Perfil 14/09)



domingo, 15 de maio de 2016

ESSES ESTUDANTES BRILHANTES E SEUS PROFESSORES ILUMINADOS, João Mendonça


ESSES ESTUDANTES BRILHANTES E SEUS PROFESSORES ILUMINADOS, João Mendonça, Mário Jorge, Tatiana Cíntia,





Há muitos por aí, talvez até mais brilhantes, mas ficarei com três grupos de estudantes dos colégios Salesiano, de Aracaju, Monteiro Lobato, de Itabaiana e Eduardo Silveira, de Itabaiana, e seus professores de literatura: Mário Jorge Figueiredo Cruz, Tatiana Cintia da Silva e João Mendonça.


O professor Mário Jorge, coordenador do ensino médio do Salesiano, abordou-me em um evento, outro dia, e ofereceu-me um livro: ”Prêmio dom Bosco de Literatura- coletânea 2011”. Ele sabia que eu lia livros. A obra é formada por contos, crônicas e poesias dos alunos vencedores do IV concurso literário interno. Textos de qualidade, agradáveis de ler, onde brilham talentos. Sem avaliar o mérito dos textos, já mereceram a aprovação de uma comissão de nomeada, fica-nos engasgada a emoção de vermos garotos agregando, já, tanta riqueza à nossa cultura.




O Colégio Monteiro Lobado, de Itabaiana (onde Tatiana Cíntia é professora), não ficou atrás. Estou com o livro “Pintando o Sete”, uma coletânea de poemas escritos por seus alunos. Ambos (Dom Bosco e Pintando) são testemunhos da educação esmerada que esses colégios proporcionam a seus alunos, moldando escritores que contarão nossa história no futuro, despertando leitores inteligentes, dos quais o País muito precisa para sair da mediocridade endêmica.




No terceiro caso (Colégio Estadual Eduardo Silveira, de Itabaiana e o professor João Mendonça) não há um livro publicado, mas uma bela produção artística sobre uma obra consagrada da literatura sergipana (e itabaianense), “Os Tabaréus do Sítio Saracura”. Os alunos, orientados pelo mestre João, entrevistaram personagens, visitaram locações, debateram com o autor, criaram desdobramentos e produziram muito mais que um livro: Peças teatrais com interpretações brilhantes; coleção de utensílios de que o livro trata; vídeos dos testemunhos dos personagens e do autor. Avaliação do ambiente rústico envolvido; coleção de fotos que certamente farão história; e muito mais.
Eu fui convidado e estive no dia da apresentação. A plateia delirava, aplaudia, chorava de emoção. 
Meninos e meninas de um colégio público (o Eduardo Silveira é), vindos da classe trabalhadora e quiçá sem trabalho certo, privaram-se de seu lazer restrito, negociaram sacrifícios com os pais, eliminaram invisíveis e talvez inexistentes “gordurinhas”, mas geraram um espetáculo admirável.

O exemplo desses ESTUDANTES BRILHANTES E DE SEUS PROFESSORES ILUMINADOS vale a pena ser seguido.


(Publicada na Perfil 16/01)


quarta-feira, 11 de maio de 2016

LÍRIO AZUL,Ailezz (Maria Zélia Silva Rocha)

LÍRIO AZUL,Ailezz (Maria Zélia Silva Rocha),J. Andrade,páginas:137,Isbn: 978-85-60075-85-0



Zélia é artista plástica, escritora e ligada aos movimentos culturais da cidade. Sempre a encontrava na Roda de Leitura da Biblioteca Epifânio Dória, duas terças feiras no mês, quando a Roda ainda rodava. Com a ida da professora Maruze para a biblioteca Clodomir Silva, Rosineide Santana, a parceira na Epifânio, mudou a estratégia, foi às escolas ensinar a ler.

Já tive o prazer de ler outro livro de Zélia, “Tomates Cereja”, que explora o lado bom da vida. Esse “Lírio Azul” anda no mesmo rumo. Há livros amargos demais, fazem os leitores acabrunharem-se, entrarem em depressão. Pelo menos os leitores sensíveis que têm alma à flor da pele. Penso que eles são necessários, mas livros doces, como os de Zélia, são indispensáveis, fazem muito bem. Precisamos sonhar, para valer a pena viver.

Deus me livre de pesadelos!

A história é trivial, não traz nada fora dos ingredientes padrões, mas agrada, emociona. Há momentos em que toca o coração, provoca lágrimas. Devagar, serena, a autora vai armando sua trama e semeia toda paz que quer. Como é bom perceber que a vida pode ser boa e que as coisas podem dar certo, mesmo que seja, apenas, nos livros de Zélia.

Para turvar esse clima quase angelical, a filha do casal (Paulo e Clara) nasceu cega, um defeito genético irreversível.  “Mas não é só com os olhos que podemos ver; com o coração também vemos e sentimos a grandeza de Deus”.

Lembrei-me agora de outra frase que me causou impacto quando a li em algum lugar que não me lembro mais: “Quando Deus permite que uma porta se feche (os dois olhos, por exemplo), abre infinitas portas para compensar e até sobrar.” Assim, a troca fica muito vantajosa. Por que se revoltar se uma chance vai-se? Deus lhe favorecerá com muitas outras, basta confiar.  

Talvez a escrita fosse outra, mas a ideia transmitida era essa. Dizer mais o quê?


Nota de leitura: LÍRIO AZUL, Ailezz (Maria Zélia Silva Rocha), 137 p – Um curto romance de enredo agradável. Há momentos que toca o coração do leitor, forçando-o a enxugar as lágrimas.  Devagar, serena, a história flui.  Como é bom perceber que a vida pode ser boa e que as coisas podem dar certo.  Ailezz já publicou outro romance, “Tomates Cereja”, que segue o mesmo padrão, e gostei muito de ler a ambos.


(Publicada na revista Perfil, ano 17 número 2)

domingo, 8 de maio de 2016

ENTRE VERSOS E INSÔNIA, Claudefranklin Monteiro

ENTRE VERSOS E INSÔNIA, Claudefranklin Monteiro, Infographics,2013,Isbn 978-85-916218-0-4



Claudefranklin é professor da UFS, pesquisador, historiador, crítico literário e contista. Pertence a Associação Sergipana de Imprensa, ao Instituo Histórico e Geográfico de Sergipe e à Academia Lagartense de Letras. É poeta também e possui dois livros de poemas: “Centrifugação” de 1999 e “Entre Versos e Insônia” (2013), este agora em minhas mãos.

Uma pessoa é poeta porque se assume como tal. Poesia é uma forma misteriosa de se expressar, usa poucas palavras e muitas figuras. Frases curtas e amplos dizeres. Um poema pode ser sentido de imediato ou nunca na vida. Um poeta é chamado bom quando os leitores o acham assim, apenas por isso. Não existe avaliador matemático investigue os méritos e dê-lhe uma nota, classificando-o.  Assim como a uma tela pintada.  Dentro de um livro de poemas, a unanimidade é quase improvável.  Cada poema é um mundo próprio e único. Uma bala perdida que pode atingi-lo ou não. No bom sentido, se é que pode haver bom sentido para bala disparada.

Sobre a poesia de Claudefranklin, digo que senti melodia, percebi sentido na sua maioria, o que foi bom para mim. Serenei (acho) um pouco mais meu trauma de brigar sempre com os poemas (e com poetas, por tabela), dentro de mim,  cobrando deles justificativas por dizerem as coisas como dizem: Palavras inesperadas, fora do rumo, aparentemente sem encaixe nenhum; verbos em tempos conflitantes, misturando abruptamente o passado, o presente e o futuro;  concordâncias e regências que disparam todas as sirenes  do bom vernáculo; ideias alienígenas vindas do nada e se imiscuindo na intimidade esperada dos versos...tintas jogadas a esmo, borrarias...  Por que diabos poetas (por muita sabedoria ou muita pedantaria) inventam uma língua nova para dizer coisas que ficam incompreensíveis, quando no português casto sobram recursos para expressá-las de maneira justa?  Até as difíceis de compreender.  E ainda há os que pregam, para desespero de meus anjos da guarda, que seus melhores poemas são os que nem sequer ainda escreveram.

Break (câmera, corte!) essa digressão impertinente. E demorada demais... Retornando de onde nem deveria ter saído, ao poema: “Entre Versos e Insônia”.

 O poema “Sergipanidade” é um épico, onde costumes e sangue se misturam para formar um povo admirável.  Vi demais?  Em “Você é a Primeira Pessoa”, revivi, sem nunca mesmo ter vivido, a história desse grande amor.  Há outros poemas que me tocaram. Vou citar mais dois (antes que acabe o espaço):  ”Resto de Dia numa Noite”, que tem a ver com o drama do poeta, a martirizante  “Insônia” (o outro).

(Publicada na Perfil ano 17, número 2)




sexta-feira, 6 de maio de 2016

ITINERÁRIOS DE LIBERTAÇÃO, José Paulino Silva,

ITINERÁRIOS DE LIBERTAÇÃO, José Paulino Silva, Sotaque Norte, 2002,


Eu não conhecia o professor Paulino até o dia em que fui visitá-lo com Ribeirão. Ribeirão? Esse maluco que me foi apresentado pelo livro “Os Tabaréus do Sítio Saracura” e virou meu grande divulgador, inseparável amigo. Maluco, veja bem, no bom sentido. Não o maluco-beleza, mas o maluco por cultura além da conta, vazando pelos poros.

Eu estava numa fase de difícil missão. Divulgava o livro (recém-lançado), “Meninos que não Queriam ser Padres”, para formadores de opinião, pedindo-lhes que o lessem e escrevessem uma “resenhinha”, qualquer coisa, sobre o livro. O professor Paulino pertencia a este naipe especial, segundo Ribeiro me confidenciou. E puxou-me pela camisa, quase arrancando a manga, na direção da casa ilustre. Para evitar fuga, arremetida, passou-me o cabresto do qual nenhum burro brabo escapa.

Eu me sinto constrangido em abordar desconhecidos, especialmente, famosos, como era o professor. Ribeiro esticava a cabresto a ponto de torar. Eu tremia por dentro como vara verde ao vento...

Seja o que Deus quiser, então! 

Fiquei na casa do professor por mais de uma hora. De boca aberta, estupefato ante tanta sabedoria, tanta originalidade e tanta simplicidade. Conheci sua esposa, a professora Walburga Arns, e admirei suas pinturas, suas esculturas... e seu parentesco. Ela é prima de Dom Evaristo Arns, um santo que ajudou a melhorar o meu País e que habita meu altar, antes mesmo da canonização.
Saí me sentindo insignificante e gratificando. Ganhei dois presentes:  o cd “Vozes e Toques Sergipanos” e o livro, “Itinerários de Libertação”. E eu só lhe dei um rústico romance cheio de interesses.

Foi uma troca vantajosa para mim, daquelas que o povo da Terra Vermelha diz, brejeiro: “peguei o boi!”


Acabei de ouvir o cd e de ler o livro. O Cd desceu fácil, como água de moringa...


Sobre o livro, pensei que não conseguiria degluti-lo, trata-se de um trabalho acadêmico, distante de minhas informalidades. Mas dei conta, acho!

 A primeira parte foca um menino que sai da zona rural e é internado num seminário de padres. É arrancado da liberdade natural, cai num emaranhado de regras e dogmas feitas para confundir, para apagar as pistas e depois levá-lo aonde quiser. Eu assisti o beijo casto, chamei mulher de “pessoa do sexo oposto”, e vi o pecado em cada revelação da natureza... Pois fui seminarista também. Que honra agora sinto em ter sido.

Mesmo após sair da primeira parte, onde o autor recupera os fragmentos da própria experiência, eu avancei na leitura, agora dando agora mais tropeços.

Como viabilizar uma educação de acordo com as características do cliente? Cada meio apresenta nuances, anseios específicos. Parece caro demais. A educação em pacote fechado, que custa menos devido à padronização, nestes anos todos de aplicação ainda não atingiu os alvos carentes...

Vejam a ignorância generalizada do povo!

Mesmo o meio termo conciliador, misto de educação padrão e específica, não parece possível. Preservar, quase sempre, fica mais caro do que substituir. E vemos, a cada dia, costumes, jeitos de ser, expressões culturais de comunidades serem dizimadas pelos pacotes disparados dos gabinetes. Desde os tempos antigos, como a nossa cultura nativa substituída, à trabuco, pelos equívocos e ganância do colonizador, muito mais primitivo.

 

Os lares do Brasil sorvem o veneno destilado pelos aparelhos de TV. Nossos jovens desaprendem a pensar, perdem o gosto de ler livros.

Chorei a morte de João de Plácido, representante da cultura que não tem mais quem a consuma ou dê o justo valor. Estamos todos robotizados, atrás do trio elétrico, pulando inconsequentes, hipnotizados pela mediocridade.

E concluo torcendo pelo sucesso da educação libertadora. Precisamos repensar o nosso “ser-e-fazer””, conforme ensina o professor José Paulino da Silva.

(Aracaju, 2010nov01, por Antônio FJ Saracura)

 

Nota: O professor Jose Paulino faleceu em Aracaju, 3m 2022nov30.

José Paulino da Silva é formado em Pedagogia e Filosofia, Mestre em Educação e Doutor em Filosofia e História da Educação. Nascido em Cachoeira do Taépe – Surubim Pernambuco, em 1942. Veio para Sergipe trabalhar na Universidade Federal, onde além de professor, coordenou o projeto de pesquisa: “Resgate da Memória Histórica: Canudos Ontem e Hoje”. Exerceu atividades administrativas tendo sido Pro-Reitor de Assuntos Estudantis, Pro-Reitor de Pesquisa e Vice Reitor. Em 1993, recebeu o título de cidadão sergipano. Tem trabalhos publicados nas áreas da Educação, Cultura Popular e História da Guerra de Canudos. Para ele, “uma educação de qualidade deve desenvolver sobretudo, o senso crítico e a solidariedade” (https://al.se.leg.br/nota-de-pesar-alese-lamenta-a-morte-do-professor-jose-paulino-da-silva/).

 

 

domingo, 1 de maio de 2016

CAUSOS DE ITABAIANA GRANDE, José Augusto Machado (Baldock)

CAUSOS DE ITABAIANA GRANDE, José Augusto Machado (Baldock),Infographics,2004),Páginas 169 (sem ibsn)




Minha mãe (hoje, maio de 2016, está com 95, e não lê mais nem a Bíblia) leu o livro de um fôlego. Logo que chegou a minhas mãos, alguns anos após a publicação, em 2009. Ela isolou-se na sua rede, não aceitava apartes, mal resmungava respostas às bênçãos pedidas pelos filhos enjoados.

Quando concluiu a leitura, eu estava junto. Concluiu e ficou pensativa, viajando longe. E eu à sua frente sem saber se a inquiria ou se aguardava o desenlace do transe. Quando já me armava para lhe perguntar o que achara, pois não aguentava mais a espera, ela truncou minha intenção.

Gostei demais! Obrigada pelo presente! Revi pessoas de quem nem me recordava mais. Parentes de minha vida toda.  O escritor só pode ser gente dos ferreiros... se não, não contaria do jeito cativante que contou!

E enlevada, prosseguiu:

João Marcelo é filho de tio Nonô.  As irmãs Graça de Rosendo e Maria de Guedes eram as donas da loja de tecidos que Zé Crispim comprou. De meu povo.  Zé Crispim não é parente mas sua esposa, Lourdes, é minha prima de sangue dobrado.  Marcelino Mecânico criou-se lá em casa, é filho de tia Ana e Chiquinho Gordo. Pedro de Anita é irmão de Marcelino Mecânico. Maceta é filho de Zé Bigodinho e de Irene, ambos da minha família.  Já Arrojado é do povo de seu pai, do Cajueiro, Congo  e Terra Vermelha. E Zentonho Ferreiro? Meu tio, quase um primo, vivia lá em casa, nas Flechas.  E Samarone é Antônio Fernandes de Maria Lourdes minha irmã. (...).

Talvez ela exagerasse um pouco (achei) contaminada pelo sangue da família que fervia não teria vantagem nenhuma. Qualquer são-tomé-espírito-de-porco (sempre há!) pode tirar a limpo em dois minutos. Basta chegar ao Santo Antônio e bater palmas à porta de uma singela e determinada casinha na rua Rosário.

Mas deixando mamãe de lado (o quê, filho ingrato? cuidado com o veneno da língua!), “Causos de Itabaiana Grande” é uma das boas obras sobre nosso jeito de ser. Histórias contadas como quem fofoca, como quem segreda.  Sem verborreia e sem empolação mas com empolgação e simplicidade. Todos os causos tem visgo que só os bons escritores conseguem botar. Pelo menos, só encontro neles.
Quem conhece José Augusto Baldock sabe que ele tem pronta uma coletânea de causos ainda mais sensacionais, precisando apenas publicar.

Publique logo, Baldock!

Minha mãe, Florita, agora com quase noventa (2009, quando escrevi essa crônica) não entende por que você está demorando tanto. Ela precisa ler a nova epopeia dos ferreiros, dos saracuras e dos demais sobrenomes que cobrem de glória o nosso povo e que só você sabe contar do jeito certo. Antes que seja tarde, para ela!

(Publicada na Perfil 15/06/2009)
PS:
Depois Baldock publicou:
1) Itabaiana Grande Seus Causos e Mais, em 2013 - Mamãe ainda leu.
2) Cartilha de Itabaiana, em 2017 - apesxarf de viva, mamãe não lia mais. Faledceu em abril de 2018  
BUSCAS E ENCONTROS e AMOR INFINITO, Martha Hora




De antemão, informo que o espaço dessa coluna é exíguo, no que concordo plenamente. Minha religião ensina que poucas palavras sempre dizem muito mais do que os longos tratados. Pelo menos, têm mais chance de serem lidas. Basta uma simples frase, se não restar a menor dúvida, sobre o temos a dizer. Um verso apenas revela o lampejo de uma alma nascida para apontar rumos.  Venho, determinado, irrigando essa planta da curta escrita, na esperança de oferecer sempre melhores frutos a quem se dispuser a ler o que publico aqui.


Martha Hora é um poetisa de Aracaju, enraizada em Macambira, na Cachoeira dos Sonhos, na Jacoca bucólica de seus antepassados.  Autora de dois livros de poemas. “Amor Infinito” (2006) e “Buscas e Encontros” (2011), os quais acabei de ler (data indefinida). Martha é uma tecelã de textos (reforço desnecessário na linguagem), pois tecido e texto vem a ser, no âmago da língua, a mesma coisa. Uma bordadeira de poemas e crônicas. Pela urdidura de seu artesanato transitam palavras carregadas de som, de cor, de cheiros, de vivas imagens.

Sobre “Amor Infinito” (146p,2006,Sercore, sem isbn), melhor seria ler os poemas. Onde vou achar palavras que os descrevam?  Alguns me pegaram pela raiz, como “Soneto para um amor”, e “Desenganos”, e “Indiferença”, e “Teu Olhar” (solitário olhar de convento encobrindo erros e segredos), e “Enigmas” (como é difícil entender a alma de um poeta!), e “Confissão” (meus sonhos acariciam estrelas). Só para ficar em meia dúzia.




Sobre “Buscas e Encontros” (117p, 2011, Infographics, isbn , 978-85-911919-0-1), o outro livro, as anotações que fiz e transcrevo indicam também que ler os textos é a única maneira de sorver o seu mel.   O jeito libidinoso de Maria no asilo, em “Cenários do Abandono”: revirando seus olhos grandes e gulosos; No aconchegante “Bom dia”: a falta que faz o porteiro Messias do Parque da Sementeira em apenas um dia que não vai trabalhar... 

Em “Sem Retorno”: a visita à velha fazenda, talvez a Jacoca da infância peralta, lembrou-me a “Casa dos Espíritos” de Isabela Allende, quando a personagem, depois de tantos anos na dor, relembra a infância dourada, tateando nos restos de si mesma e de seu passado, envolvidos no pó dos móveis apodrecidos pelo longo abandono.  

Há sempre uma mistura do sublime com o corriqueiro nos textos de Martha Hora, fazendo o leitor sentir-se na terra enquanto navega no céu. Cada poema é um conto e cada conto, um poema a ser desfrutados, ambos, com enlevo. E se caírem lágrimas, mesmo invisíveis, serão enxugadas com o manto da alma, como ela incansável canta e o faz.