A SAGA DE UM HEROI, William Soares,
2021, edição particular
Eu já vira o autor em alguma reunião
por ai (ele é da equipe de escritores médicos) e até passei os olhos em um
livro de sua autoria, “A 16.Missão”, que me caiu às mãos, mas nem cheguei a ler,
pois tratava de tema que outro livro, este de Cleiber Vieira. Achei que não
deveria perder tempo com redundâncias. Talvez devesse.
William Soares esteve na reunião da
Academia Sergipana de Letras ontem, dia 19 de setembro de 2022, se apresentando
como o novo presidente da Academia Sergipana de Medicina, décimo a ocupar o cargo, e distribuiu dois novos
livros de sua autoria. “A saga de um herói” e outro, apenas uma brochura, com seu discurso de posse na presidência na academia de que falei acima: “Um passeio de marinete".
O primeiro é uma homenagem ao médico
Semmel weis, húngaro, que descobriu a causa da Praga dos Médicos ou Febre do
Parto, que matava 16% das parturientes nos grandes hospitais. A cura seria apenas
a mudança de um costume: os médicos teriam que lavar as mãos antes de cada
parto.
Mas nenhum médico, nenhum cientista
da área aprovou a mudança, nenhum chefe de hospital adotou o novo costume. Mesmo
com argumentos irrefutáveis apresentados pelo doutor IFS Semmelweis: que as mulheres assistidas
por parteiras práticas não morriam, que os médicos contagiavam as parturientes quanto
passavam pelos necrotérios do hospital antes...
“Uma ideia nunca deve ser
apresentada antes de sua hora e de seu tempo.”
Mas como esperar mais, diante da gravidade
da situação?
Doutor IFS encontrou a cura antes do
tempo certo. Seria?
Então publicou artigos nos jornais, fez palestra em
congressos, acusou os médicos de genocidas...
Perdeu o emprego, não achou outro
digno. Publicou um livro sobre sua experiência médica e suas teorias, mas não foi
bem aceito no meio. Rejeitado pelos colegas, indigna-se,
isola-se, estressa-se.
Logo é internado em um hospício. E morre dias depois. Envenenamento
do sangue, a partir de lesão gangrenada na mão direita. Ferimento causado na
luta contra os trogloditas que o internaram à força. Exames posteriores
confirmaram que a morte foi causada pela mesma enfermidade que matava as mulheres
paridas.
No tempo certo, 32 anos depois,
Pasteur e outros cientistas convenceram ao mundo que os médicos deveriam mesmo
lavar as mãos (depois vieram as luvas), como pregou o doutor Semmer Weis.
Um bom livro tanto para mim, paciente expectador, quanto para os autores dessa tragédia que é a vida, os médicos.
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E o o outro livro, "Um passeio de marinete", é uma espetacular viagem, bem elaborada e bem humorada. Cheia de lúdicas lições. Sem medo de avançar, de enfrentar, de brigar, de subir ou descer...
Willlian, é filho de Boquim, criado em Tobias, crescido em Aracaju, cidadão do mundo (atuou
como médico na Europa e sul do Brasil), e estabelecido outra vez em Aracaju,
onde atua no campo da oncologia.
O livrinho é um tocante poema, que poetas perdidos
por aí precisavam ler para aprender a magia de dizer muito com quase nada de palavras. Sabe bem encantar com flores comuns que juntas formam um jardim surpreendente.
O retorno aos pagos da infância que todos vivemos: correr pra casa antes que a luz
apague, tomar banho na água fresca da fonte da mata, tremer ante a ordem de
volte para casa "seus cabruncos"... O carro de boi gemendo, o trem Estrela do Norte
apitando na estação de Boquim... O bordado da vida estudantil, a
faculdade e São Paulo que é o destino certo para todos. A quarta pátria que o espanta com a poesia concreta das esquinas e a beleza discreta das meninas.
Apenas cinco dias perdido na garoa densa, bate-se com garota que lhe
pergunta: “como vieste parar aqui, se os muros são altos e difíceis de escalar”? E, que nem Romeu, respondeu: “com as asas do amor... ".
Bem depois, quando desce da
marinete em um meio dia canicular do verão sergipano, corre em busca da sombra solitária no meio
da praça deserta pra não torrar. É a sombra de um pau Brasil, remanescente. Nativo
que escapou dos machados dos colonizadores e dos herbicidas dos novos donos de tudo. Ancião, desconsolado, sozinho e indefeso. Algumas
vargens penduradas logo soltarão sementes no chão estéril de paralelepípedos.
Será
o fim da espécie nobre que deu o nome a esta terra inteira.
É selado, então, um pacto tácito entre
a velha árvore à morte e o novo médico cheio de vida.
E William recolhe as vargens secas e sai em busca de um cantinho fértil para plantar as sementes, seja no
chão do quintal de sua residência ou no coração receptivo de cada um de nós.
É tempo certo para recuperar
o símbolo de nossa pátria. Já passou, mas ainda pode.
(por Antônio FJ Saracura, Aracaju, 22 de setembro de 2022).