LINGUAGEM POPULAR SERGIPANA E OUTRAS PRECIOSIDADES, Benvindo Salles de Campos Neto, Segrase/Edise, 2022,organizada por João Mário Ribeiro Lima Sales de Campos. isbn 978-65-86004-55-7
Após
a solenidade de instalação da Academia de Letras de Arauá (14.12.2024), na qual
fui agraciado com o título de membro correspondente, cruzei, no hall do salão
onde pessoas batiam fotos e se abraçavam, com João Mário, que eu nunca vira. E
iniciamos uma conversa espontânea, como se já fôssemos velhos conhecidos. Ele
estivera na mesma solenidade, acompanhando a família de José Olino, filho do
Arauá e homenageado como patrono-mor da academia.
-
Você é o Saracura?
-
Sou, e o senhor, quem é?
-
Sou filho de Bemvindo Sales de Campos, que foi seu confrade da Sergipana. Meu
nome é João Mário...
(Eu
o interrompi):
-
Logo o filho de Benvindo, de quem estou lendo “A linguagem popular sergipana”,
que me encanta a cada verbete?
Neste
momento, alguém me puxa pela camisa e chama: “Venha, Venha!” Com o rabo do
olho, vejo que é Cris, a estrela essencial de toda festa literária
e entendo que me convida para entrar em uma foto, que seria
antológica, o grupo de becados está postado, aguardando.
Mas
não posso largar o filho de Benvindo, que alguém chama de um carro estacionado
na rua, com a porta traseira aberta. E não devo ignorar Cris e nem o grupo que
me espera, seria a deselegância que abomino. Mas não vejo alternativa: seguro João pela camisa,
pois já ia se indo e digo a Cris: “Estou ocupado, agora não posso de jeito
nenhum.”
Cris me
solta e incha chateada, nem escutou o descabido porque, eu percebo o clima desconfortável
e sujeito a represálias, mas agora, sou
somente ouvidos para o filho de Benvindo, que prossegue na fala sustada:
“É
um livro póstumo, saiu agora em 2022, meu pai faleceu em 2010. O manuscrito
ficou jogado em uma gaveta, no meio de folhas soltas com anotações feitas à
mão. Botei tudo em ordem, mantive intato cada pensamento de meu pai. Deu
trabalho, mas saiu editado pela Edise... Viva Deus! E correu ao
carro que lhe daria carona para retornar a Aracaju, desculpando-se.
Quando
me voltei em busca de Cris (demorou tão pouco, mas o tempo voa), não havia mais
ninguém batendo fotos; ela e Pascoal me esperavam (impacientes) ao lado do
carro, com a porta traseira aberta, para retornarmos.
xxx
Viana
de Assis, que escreveu a orelha do livro de Bemvindo e disse: “O livro revela a
alma e o caráter do povo de Sergipe na forma mais expressiva que é a fala.
(...) A dicionarização das palavras e expressões colecionadas por Bemvindo, é a
preservação do mundo cultural do nosso lugar, sem retoques e
enfeites que lhe diminuam a autenticidade”.
O
historiador José Anderson Nascimento andou na linha paralela e escreveu no
prefácio (preparando o espirito do leitor, talvez): o livro também
reúne palavras de baixo calão, que se apresentam como impróprias, ofensivas,
rudes, agressivas e imorais sob o ponto de vista de algumas pessoas eruditas,
religiosas e castas.”
E
me cabe então citar uma dúzia de verbetes ou expressões (sem o seu significado
completo, que algumas vezes consiste em um rico tratado de linguística ou
apresentação de gorda relação) e que, para mim, brilham
como burilados diamantes, tenham ou não conotação imoral:
Usurenta
(sovina)
Trivilusco
(desorientado)
Sibarita
(macho duvidoso)
Sendeiro
(cavalo chucro)
Puxá
(falta de ar)
Matrosa
(mal arrumada)
Grismela
(magra)
Fute
(diabo)
Cheba
(bunda mucha)
Chanfrona
(sapatona)
Bulir
(deflorar) e
Roncoio
(que tem um ovo só).
E,
por fim, digo que João Mário está de parabéns e que comemore junto comigo bom e
corajoso livro de seu pai. Sobre as palavras pesadas, elas me soam saborosas, tentadoras. O filósofo e escritor, Cleiber Vieira,
responsável pela apresentação do livro, cita dois clássicos tratando do mesmo
produto: “Dicionário do palavrão e termos afins ” de M. Souto Maior, uma
reedição de 2010, e o “Dicionário Popular”, de Raimundo Magalhães (1911). E
nada revela sobre represálias sofridas pelos autores.
(Por
Antônio FJ Saracura, em Aracaju, 03/01/2025)
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