segunda-feira, 11 de novembro de 2024

ME CANSEI DE SERVIR AO DIABO

 

ME CANSEI DE SERVIR AO DIABO, Aduilson Gois Oliveira, 2024, Infographics,Isbn 978-65-5730-205-7

 


Cinco anos atrás, acredito que em algum dia de 2019, atendi o telefone e uma voz feminina perguntou o meu nome e me pediu para anotar um endereço. Era de Planaltina, uma cidade satélite de Brasília, que eu conhecia do tempo em que morei na região. Pediu-me para mandar todos os meus livros publicados, pegou minha conta bancária e o valor da encomenda. Despachei o pacote  para Josefina Maria, nome que me pareceu fictício.

Soube, bem depois, que os livros eram para Aduilson Gois Oliveira, neto de tio Omero  (irmão de minha mãe),   filho de Antão, este, negociante de bodes e esterco de criação. Em algumas oportunidades, me vendeu sacos de esterco para adubar meus coqueiros no Robalo.

Quando comprou os meus livros, Aduilson era foragido da justiça e tocava um depósito de bebidas até ser recapturado pela polícia penal. Dos quarenta anos que tem,  mais de vinte ficou preso ou fugindo da polícia. Agora,  está em liberdade condicional do Presídio de Areia Branca.

Em um sábado destes,  me convidou para o visitar em sua casa, em um conjunto residencial na nova Itabaiana. Encontrei-o, pela primeira vez na vida (ele é de uma geração mais nova), feliz, junto com a esposa e três filhos, um já rapazinho, e todos nascidos enquanto ele estava ou preso ou fugindo. Conversamos uma manhã inteira. Gostei do clima da casa, havia concórdia em cada gesto, em cada palavra. Disse-me que os livros (leu vários autores na cadeia) o ensinaram a escrever livros também. E me entregou um calhamaço manuscrito. “São três livros que escrevi e contam minha via sacra de crimes e de penitências. Veja se vale a pena publicá-los?”

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Já saiu publicado o primeiro, intitulado, “Eu Cansei de Servir ao Diabo”, que foi sucesso de vendas. Esgotaram-se os dois mil exemplares em dois meses. A segunda edição já está no prelo. O livro tem leitura agradável, sem subterfúgios e sem floreios, conta sua vida: a infância nas Flechas, na companhia do pai comprando esterco e bodes no sertão da Bahia e Pernambuco.  Após a separação dos pais, ele foi trabalhar, ainda garoto, para ajudar a manter os irmãos. Teve barraca na feira, foi empregado de carteira assinada ou na informalidade, montou lava jato, se envolveu com drogas, arrumou namorada, casou, entrou no crime. 

Em 2018, cumprindo solitária, resolveu mudar sua vida. Houve a catequese religiosa, houve o apelo da esposa (que ficou presa mais de um ano injustamente, por ser mulher de bandido) e o amor aos filhos que cresciam e precisavam cada vez mais dele. Topou difíceis desafios, estudou o curso secundário (há incentivo na cadeia), cursa história na universidade, toca a empresa Gois grãos que intermedia safras de milho e atende criadores e agricultores da região. 

Já publicou o segundo, que se chama “A Liderança”: comandando um pavilhão com mais de 100 detentos no Presídio.. 

O terceiro está no prelo, “Histórias do Povo”: um cabrinha, chamado Saracura (meu xará das Flechas, já falecido e que tive a honra de o conhecer) é um anti-herói picaresco, mistura de Cancão de fogo, Pedro Malasartes e João Grilo).  

"Me cansei de servir o diabo" é uma história real que arrebata. Será um filme de sucesso se tiver a sorte de ser descoberto por um cineasta de valor.  

(Por Antonio FJ Saracura, Aracaju, 10/11/2024).


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