ME CANSEI DE SERVIR AO DIABO, Aduilson Gois Oliveira, 2024,
Infographics,Isbn 978-65-5730-205-7
Cinco
anos atrás, acredito que em algum dia de 2019, atendi o telefone e uma voz
feminina perguntou o meu nome e me pediu para anotar um endereço. Era de
Planaltina, uma cidade satélite de Brasília, que eu conhecia do tempo em que
morei na região. Pediu-me para mandar todos os meus livros publicados, pegou
minha conta bancária e o valor da encomenda. Despachei o pacote para Josefina Maria, nome que me pareceu
fictício.
Soube,
bem depois, que os livros eram para Aduilson Gois Oliveira, neto de tio
Omero (irmão de minha mãe), filho de Antão, este,
negociante de bodes e esterco de criação. Em algumas oportunidades, me vendeu
sacos de esterco para adubar meus coqueiros no Robalo.
Quando
comprou os meus livros, Aduilson era foragido da justiça e tocava um depósito
de bebidas até ser recapturado pela polícia penal. Dos quarenta anos que tem, mais de vinte ficou preso ou fugindo da
polícia. Agora, está em liberdade
condicional do Presídio de Areia Branca.
Em
um sábado destes, me convidou para o
visitar em sua casa, em um conjunto residencial na nova Itabaiana. Encontrei-o,
pela primeira vez na vida (ele é de uma geração mais nova), feliz, junto com a
esposa e três filhos, um já rapazinho, e todos nascidos enquanto ele estava ou
preso ou fugindo. Conversamos uma manhã inteira. Gostei do clima da casa, havia
concórdia em cada gesto, em cada palavra. Disse-me que os livros (leu vários
autores na cadeia) o ensinaram a escrever livros também. E me entregou um
calhamaço manuscrito. “São três livros que escrevi e contam minha via sacra de
crimes e de penitências. Veja se vale a pena publicá-los?”
xxx
Já
saiu publicado o primeiro, intitulado, “Eu Cansei de Servir ao Diabo”, que foi
sucesso de vendas. Esgotaram-se os dois mil exemplares em dois meses. A segunda
edição já está no prelo. O livro tem leitura agradável, sem subterfúgios e sem
floreios, conta sua vida: a infância nas Flechas, na companhia do pai comprando
esterco e bodes no sertão da Bahia e Pernambuco. Após a separação
dos pais, ele foi trabalhar, ainda garoto, para ajudar a manter os irmãos. Teve
barraca na feira, foi empregado de carteira assinada ou na informalidade,
montou lava jato, se envolveu com drogas, arrumou namorada, casou, entrou no
crime.
Em
2018, cumprindo solitária, resolveu mudar sua vida. Houve a catequese
religiosa, houve o apelo da esposa (que ficou presa mais de um ano
injustamente, por ser mulher de bandido) e o amor aos filhos que cresciam e
precisavam cada vez mais dele. Topou difíceis desafios, estudou o curso
secundário (há incentivo na cadeia), cursa história na universidade, toca a
empresa Gois grãos que intermedia safras de milho e atende criadores e
agricultores da região.
Já
publicou o segundo, que se chama “A Liderança”: comandando um pavilhão com mais
de 100 detentos no Presídio..
O
terceiro está no prelo, “Histórias do Povo”: um cabrinha, chamado Saracura (meu
xará das Flechas, já falecido e que tive a honra de o conhecer) é um anti-herói
picaresco, mistura de Cancão de fogo, Pedro Malasartes e João
Grilo).
"Me
cansei de servir o diabo" é uma história real que arrebata. Será um filme
de sucesso se tiver a sorte de ser descoberto por um cineasta de
valor.
(Por
Antonio FJ Saracura, Aracaju, 10/11/2024).
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