quarta-feira, 21 de julho de 2021

A SAGA DE UM PILOTO

 

A SAGA DE UM PILOTO, J. C Queiroz, Editora Image 2021, 48p Isbn 978-65-992413-5-2.



“A Saga de um Piloto” não mergulha nas águas da Mãe D’água es avança no tempo para o ano de 2050, com o piloto James, um menino da roça que sonhava alto e esbarra com no seu destino improvável.

Um acidente aéreo, que James evitou por um triz, muda sua vida. Descobre o Apocalipse profético que lhe contesta a vida pasteurizada.

O autor do livro se levanta das páginas e conversa com o leitor. Um diálogo do materialismo com a espiritualidade. 

 As crises nos arrancam do conforto, criando um recomeço, fazendo-nos superar os limites.

O erro que persiste... E não conseguimos nos perdoar ou perdoar a quem nos machucou.

Lições obvias, mas que fazem bem ouvi-las de novo.

 

 (Aracaju, 26 de junho de 2021, por Antônio FJ Saracura, em plena pandemia do Corona).

POESIA AOS CINCO CANTOS

 

POESIA AOS CINCO CANTOS, Viviane dos Santos Cardoso, Aracaju, Artner, 2021, 68p, isbn 978-65-88562-27-7

 



Viviane é do povoado Taborda, Nossa Senhor das Dores, onde viveu ate os vinte anos. Ela ainda é jovem. E na Taborda esteve sempre envolvida com a arte, pois em seu lugar há infraestrutura que possibilita isso. A ONG “Cultivar” oferece entretenimento, educação e cultura na região sul do município de Dores, onde está a Taborda. Nem só a lida dura do campo enche o dia a dia do povo da zona rural. E Viviane, como muitos moradores destes povoados de Nossa Senhora das Dores,  desde garota,  participou de antologias literárias, ensaiou poesia e prosa, ganhou prêmios.

Tenho acompanhado e me gratificando com o tema da maioria dos textos produzidos por esta garotada dorense:  histórias do povo do lugar. 

Conhecendo bem nossa gente e lugar, em vez de nos envergonhar,  nos orgulhamos deles a vida toda.  

 “Poesia aos Cinco Cantos ”, primeiro livro solo de Viviane, fala de Taborda, da terra mãe, da família, dos sonhos,  das queixas, das dores e do espanto ante o mundo complicado quando precisou voar mais longe. São poemas simples como a natureza no campo,  têm o sabor da fruta respingada de orvalho colhida no pé .

O livro está segmentado em cinco cantos como o título anuncia. O primeiro canta o povoado; o segundo rememora a vida vivida; o terceiro trabalha o social e seus ingredientes bons e maus; o quarto trata da família; o quinto, do sonho do poeta. 

Sem o rigor da matemática.

Gosto da ousadia, que pratico com parcimônia, e que não deveria.

Gosto de quem canta seu mundo (sua aldeia) e tento fazer isso também por que estou satisfeito com o que Deus achou que me servia.

Que Viviane continue fiel ao seu lugar, o melhor do  mundo para ela! E que o cante a vida toda, assim: 

 

“Sem muita extensão,

Luxo,

Urbanização.

Sem muito barulho,

Correria,

Gritaria.

É assim o dia a dia

 No melhor lugar do mundo.

É assim no Taborda

E dele eu não mudo”.(Página 11)

 

Aracaju, 21 de julho de 2011, Antônio FJ Saracura

terça-feira, 20 de julho de 2021

A CASA QUE SÓ TINHA JANELAS

 

A CASA QUE SÓ TINHA JANELAS, Aderbal Bastos Barroso, J. Andrade, 2021, 204 páginas, 21 cm, isbn 978-65-993739-5-4

 


Mais um livro do profícuo Aderbal Barroso, presidente da Academia de Letras e Artes de Neópolis. Em pouco tempo nos presenteou com "No Remanso do Rio" (2014), "À Sombra dos Oitizeiros" (2017), "Agridoce Melaço de Cana e Jabuticabas Maduras" (2018), "Carvão Aceso" (2019), e este, "A Casa que só tinha Janelas", em 2021. Achei todos bons. Nesse meio tempo, organizou/participou de Antologias, como “Neópolis Academia de Letras”, que a tenho. Ela contempla a produção intelectual de membros da arcádia (poesia, crônicas, músicas com endereços do áudio no Youtube, artes plásticas) e inclui sucinta história de Neópolis e da academia de letras (atas iniciais e biografias dos patronos e os membros fundadores de cada cadeira.

“A Casa de só tinha janelas”, o mais recente, que tenho aqui, são crônicas curtas e tratam de acontecidos na beira do Rio São Francisco (cenário recorrente na obra de Aderbal). Canoeiros, pescadores, lobisomens, mães d’água... Zé Mandin, Gato Vagalume, Roque das Mulas, Joãozinho Barroso (JB), Cila do Brejo da Conceição, Zé Simão, Alemão de Água Doce, tia Nanã, Sebastião Salomé...

Personagens mitológicos ou venerados no beiradão imenso do grande rio ou na imaginação privilegiada do poeta e prosador.

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"A Casa que só tinha janelas” possuía portas, nas sempre fechadas.

Em certa manhã, eles estavam na mesma praça da Casa que só tinha janelas, seu Adroaldo amolava a foice na soleira da porta de sua casa, preparando a amiga para o trabalho e seu Zé de Lídia (seria Aderbal?) ia à padaria e, em sua cabeça, amolava a caneta de contar histórias. Atônitos, os dois viram portas abertas na casa. Seu Adroaldo ficou paralisado. Mas Zé de Lídia foi lá, subiu a escada, olhou o interior tão carregado de segredos. Entrou na casa e pasmou ante cantoria de igreja, o cheiro de incenso, o tilintar de turíbulo fumegante na capelinha de Nossa Senhora Menina. Tudo se configurava real. Abriu caminho por entre a gente toda que já estava circulando na casa e chegou em um imenso salão iluminado por velas. No meio, estava um caixão azul-celeste, cheio de flores amarelas, que escondiam um corpo do qual aparecia apenas o nariz. 

Naquele dia, Zé de Lídia chegou a casa da avó sem os pães que toda manhã ia comprar, mas em compensação, trouxe um braçado de boas histórias para contar, que eram o segredo que se perdia nesta misteriosa casa que só tinha janelas.

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Apresento, a seguir, três excertos que dão o batido da prosa de Aderbal nas histórias vividas ou ouvidas, como confessa, de pessoas do rio e alagados em volta. Tesouro pouco e explorado pela literatura, que agora ganha seu Homero ribeirinho. Neópolis, Brejão dos Negros, Brejo Grande, Santana do São Francisco na margem de cá, e outras localidades da banda de lá, nas Alagoas.

“A patroa estava inconformada por causa do achaque de indiferença do macho da casa, ultimamente ele não estava conseguindo uma levantadura suficiente para o gasto” (Fumo de Rolo)”.

“Todo fato, por mais simples que fosse, quando caía na roda e era tecido no fio da conversa, se transformava de vez em um senhor acontecimento” (Quem Herda não Furta)”.

“Ela era muito animada e se realizava em contar sua vida na lavoura e nos currais de gado leiteiro de seu patrão, o coronel José Guimarães, o Zé Padre, como era conhecido nas aguadas de Parapitinga, hoje chamadas Brejo Grande”. (Xícaras Azuis).

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Um livro que dá gosto ler. 

Aracaju, 20 de julho de 2021, revisada em julho 2022, Antônio FJ Saracura.

 

 

domingo, 18 de julho de 2021

RETORNO AO DESMEDIDO SILÊNCIO

 

RETORNO AO DESMEDIDO SILÊNCIO, Jânio Vieira, Aracaju, Artner, 2021,  89 páginas,Isbn 978-65-88562-25-3

 

De cara me veio à mente o bom “Translúcido Silêncio” de Manoel Cardoso, um poeta de Nossa Senhora das Dores mas radicado em São Paulo há anos e que conheci via uma irmã dele que tocava pequena papelaria na Coroa do Meio, na rua que eu morava. Cheguei a mandar um livro de minha autoria para Manoel, mas não me lembro de que tenha dado retorno. Seu livro de poemas me pegou e não tenho qualquer constrangimento em chamá-lo bom e ao poeta,  de meu amigo. .

Quando eu estava lendo os poemas de Jânio, vi-o numa “live” falando sobre si  e sobre sua estreita ligação com o vate Manoel Cardoso. Um amigo de Manoel é meu também. 

Os poemas de "Retorno ao Desmedido Silêncio" são curtinhos, entretanto poderosos. E me pegaram também. Consegui captar a alma na maioria e gostei dela. Claro que em um livro de poemas a unanimidade é impossível, sempre vai haver poemas que, por mais que o arrodeemos, por mais que o mordamos pelas beiradas, escapam incólumes deixando um travo na boca: “que diabos o poeta quis dizer aqui?”

Mas estes não chegam a tirar a beleza do conjunto.

Achei ótimos: “Os olhos” (o poeta se amplia em sua dor); “Ao abrir a janela” (ali os cantos dialogam e se entendem); “A Percepção” (para se ver bem é necessário imaginar); “A Noite” (é um constante duelo com minhas metades); “Quando eu tinha sete anos” (Mal sabia que estava capturando poesia); “Procuro” (o indizível)...para citar alguns.

Compartilho com o que diz Joao Paulo Araújo Carvalho, na orelha do livro, sobre o contista, cronista, poeta e membro da Academia Dorense de Letras, Jânio Vieira: “A poesia de Jânio volta à infância, ao passado, à memória, num caminho de contemplação palmilhado de imaginação, ludicidade, simplicidade e inocência, como num sorriso infantil.”

Então “Retorno ao Desmedido Silêncio” é um bom livro de poesias.

(Aracaju, 24 de junho de 2021, revisão em 2023ago04, por Antônio FJ Saracura).


terça-feira, 6 de julho de 2021

CONTOS QUE A LEITURA ESCREVEU

 

CONTOS QUE A LEITURA ESCREVEU, Leosmar Simplício da Silva, Aracaju, Editora Brasil Casual,2021, 144 página, Isbn 978-65-86316-10-0.

 


Leosmar Simplício da Silva é um leitor compulsivo, leu 51 livros de janeiro a junho de 2021, o que dá uma média de mais de oito livros por mês, dois por semana. Performance que vem se mantando até hoje. Nem eu no meu tempo de seminário, nos dois últimos anos antes de ser expulso, quando enchi uma caderneta com os títulos dos livros lidos. Mas eu não fazia mais nada, apenas lia. Leosmar tem família para cuidar e tem aulas em dois colégios para ministrar.

“Contos que a leitura escreveu” tem prefácio e apresentação que li agora, e me deixou com inveja dos autores, pois disseram o que senti, mas não achei as palavras deles.

O livro compõe-se de gostosos textos sobre nosso lugar e povo, com seus tipos, suas paisagens, seus costumes. Fui carreiro (na verdade, menino-chamador) de carro de bois na minha infância e me encantei quando as cantadeiras (feitas aqui de cajueiro, quem diria!) abriram o bico no mundo enchendo as baixadas e serrotes a riba.

Aborda o campo engrandecimento humano, onde Domingos Pascoal e Augusto Cury caminham fagueiros, e se sai bem. Conta casos que exemplam, mostram caminhos, surpreendem pelos desenlaces nobres. Aqui e ali há um ensaio de assombração, que faz parte de minha escrita; um pouco de Edgar Alan Poe, amigo íntimo de Leosmar, sou testemunho pelos títulos lidos que as redes sociais dão conta. E não podia faltar a chuva torrencial que inebria o homem do sertão seco. Bênção, dádiva, grandeza, fartura. Daqui a pouco: felicidade.

E há as confissões do professor vocacionado que busca transformar alunos comuns em brilhantes. A missão vai além, fazê-los escrever. Derruba equívocos, como o de que não vale a pena estudar, pois emprego não haverá mesmo.

Homenageio, especialmente, os contos: “Primeira Viagem de ônibus” (cinematográfico); “A Menina que não sabia nadar” (surpreendente); ”No mundo da lua” (perfeito); “Jogo de Bola” (gratificante)...

(Antônio FJ Saracura, Aracaju, de julho de 2021, revisão em agosto de 2023). 

 

 


quarta-feira, 26 de maio de 2021

PEDAÇOS D ALMA, José Gumercindo Santos

PEDAÇOS D ALMA, José Gumercindo Santos, BAHIA Artes Gráficas, 1981 221 páginas, sem isbn


 

Agora o escritor é médico da alma; doutor com todos os graus, um santo (quase) da Igreja Católica. E, como quase todos, questionado no seu tempo. Esse “quase” é por conta de São Francisco de Assis, na Itália, e Padre Pedro de Oliveira, aqui de Sergipe, para focar dois.

José Gumercindo Santos, com realizações basilares em Sergipe e Bahia (escolas, congregações) narra, em “Pedaços d’Alma”, a própria história. Humildemente, docemente, alegremente, sofridamente, literariamente... Libertando pingos de sua alma que tocam o coração do leitor. Pingos líricos, pingos dolorosos. Vitórias, derrotas, avanços, recuos...

O livro começa com Gumercindo ainda menino com cinco anos (colherinha de prata, Itabaiana 15 de agosto de 1910) e alcança os últimos dias de vida laboriosa. Um testamento das fortunas que produziu em uma vida de intensa dedicação à Igreja (apostolado) e à Educação (magistério).

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O ônibus de turismo parou em frente a um prédio imenso numa praça de Tucano, na Bahia. Todos descemos para conhecer o seminário São José, da congregação dos Joseleitos de Cristo. Um guia local veio nos receber. Ali era um ponto turístico. Corremos os sombrios corredores vazios (não me lembro se era período de férias ou o se o colégio estava desativado) e, por fim, fomos conhecer os aposentos do padre Gumercindo (há muito falecido) que agora era um museu. Uma capela em honra a um Santo que requer reconhecimento. Vídeos de palestras, manuseio de livros autorais, consulta a números de revistas que foram a mão do padre abençoando seus frutos espalhados pelo Brasil e até fora. Padre Gumercindo, sergipano de Itabaiana, mudou a vida cultural daquela cidade no sertão baiano. Como já havia mudado a de Boquim, em Sergipe. Como mudaria muito mais se não fosse a tradicional retrógrada igreja católica que, pelo que conta a história, nunca aceitou a maioria de seus santos, enquanto vivos. Padre Gumercindo travou guerra intensa para quebrar os tabus, para tirar a igreja do caixão apertado do comodismo. Criou calos. Levantou bandeiras brancas quando deveria comemorar vitória. Adiou vitórias certas para satisfazer vaidades vãs. Submeteu-se diante dos homens que mandam, pedindo a Deus que os perdoasse.

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O que é bom no livro excede, tanto pela beleza da escrita como a singularidade dos casos narrados, que são estações da via sacra de um mártir. Além das curtas crônicas, há densos relatórios das viagens cumprindo seu apostolado, fosse sob a mitra de dom Lustosa e outros dons, entre igarapés e piranhas antropófagas como em gabinetes escamosos de uma Roma burocrática e discriminadora ou de uma América do Norte formal, mas solidária.

Não há como um bom livro caber em qualquer resenha por melhor que o resenhista seja. Quanto mais na resenha de um Saracura qualquer.

Vou então apontar flashes que brilharam mais para mim (alguns dos muitos), tentando revelar um pouco do que me surpreendeu, me encantou, me comoveu: 

Infância pobre no Zanguê, capina bamburral sob chuva e sol... E então o pai se vai e não retorna. A mãe passa fome com os filhos na rua do Sol, na cidade de Itabaiana. O menino com sete anos é o homem da casa, arregaça as calças curtas e se mistura aos moleques colhedores de água no fundo Tanque do Povo para encher os barris dos jegues almocreves que abastecem a cidade. Gorjetas que ajudaram a mitigar a fome de casa.

O padre José Vicente de Jesus, pároco operoso de Itabaiana, deu azar. Em uma Santa missão na cidade, os frades capuchinhos crismavam crianças. Beatas radicais não aceitaram como madrinha a rapariga do Coronel Sebrão, truculento chefe dos Pebas. Os frades, montados em dois jegues, sob apupos, foram enxotados da cidade. E o padre Vicente ficou com a rebordosa de uma guerra desigual, que o sacrificou. "Eu era coroinha e vendo o sofrimento do vigário, deu uma vontade enorme de ser padre. Ser mártir e santo como nas histórias que lia, como eu via padre Vicente em sua via-sacra."

Jogo entre o Salesiano (eu era aluno interno na Tebáida) com o juvenil do Confiança: O confiança era quase profissional, cantado como imbatível. Mas o jogo foi disputado e ia terminar zero a zero para nossa glória. "Com o tempo esgotado, acertei minha canhota firme, o goleiro nem viu, balancei a rede. Não sei se o Confiança de 1920 tem registrada essa derrota em seus anais."

Em dois anos que fiquei na missão no Amazonas, compus um dicionário tupi, latim, português aproveitando aparas de papel que havia. Trouxe-o comigo. Em Boquim, onde me instalei, publiquei na revista “Segue-me” partes desse dicionário, ao qual eu ia me dedicando quando havia tempo. Mas a ignorância de alguém botou no lixo todo meu tesouro. . Chorei lágrimas com pedaços de minha alma.”

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"Um ex aluno, no dia seguinte à minha expulsão do salesiano, me arranjou um quarto espaçoso no Asilo dos Velhos, bem em frente ao seminário Diocesano, me tirando da rua. Era o diretor do asilo na época e se chamava “José Bezerra”, (mais tarde foi Juiz em Itabaiana, já falecido).

Dom José Tomás Gomes da Silva recuou de sua decisão de dar apoio às minhas congregações e exigiu que eu desmanchasse as obras, todas pelo bem do povo pobre e da igreja: “Vá a Boquim e tire o hábito das moças e mande-as para suas próprias casas. Não quero encrenca com a Santa Sé.”

“A vida do religioso (José Gumercino) é um autêntico testemunho de seguimento de Jesus pela prática do amor. Deixou um legado de total consagração a Deus, servindo aos pobres, órfãos, jovens e vocacionados, através da educação e da prática da caridade em instituições e pastorais", disse Gildásio Penedo Filho, parlamentar baiano, nas comemorações do centenário do padre (1907-1991), em 15/08/2007,

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A beatificação do padre Gumercindo Santos está sendo analisada na Santa Sé. Um postulador designado por católicos e religiosos, especialmente de Boquim e Tucano, está em Roma defendendo o projeto. Equipes de religiosas (Coordenada pela irmã Simone da Congregação de Santa Terezinha) busca testemunhos de sua vida santa. A historiadora Ana Medina, que é de Boquim e pertence a uma família ligada à obra de padre Gumercindo na cidade, acredita que logo seja reconhecido pela Igreja como santo. Santo sergipano, filho do Zanguê, em Itabaiana.

(Antônio FJ Saracura, Aracaju, 23 de maio de 2021, infectado pelo Corona Virus, revisado em agosto de 2023).

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Apêndice à Resenha

(para quem quiser mais informações).


(Anotações soltas da leitura do livro)

Em Itabaiana havia, uma festa em cada  esquina. No aniversário da queda de Canudos, que se deu em 1897, a Praça da Matriz se enchia de ranchos de palha, imitando Canudos. Antônio Conselheiro fora venerado em Itabaiana onde consta que viveu um tempo. Às 9 da manhã, começava uma batalha simulada. A população de posta atenta. "Quando eu vi pela primeira vez o fogaréu do incêndio das choupanas de palhas e a correria da polícia e dos soldados do exército esmolambado atrás dos jagunços (pega-pega, mata-mata), deixei minha mãe e corri para me esconder. Nesse momento, um grupo de jagunços atirando com seus bacamartes para o ar, desembocou ao meu lado. Aturdido, gritei e chorei sem saber para onde ir. Passei o resto do dia sem achar o caminho de casa." 7

O doutor Teotônio Martins, senador baiano, grande médico e político, contava que, como quintanista de medicina, esteve na tomada do arraial e assistiu o assassinado de quinhentos jagunços, que em duas filas, dois a dois, gritavam, antes de serem sangrados: “Viva o Conselheiro.”

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A Festa do Círio de Nazaré, desde a véspera ao ocaso, é um documentário cinematográfico digno de um Óscar, no qual um Brasil inédito e surpreendente se revela nos seus ricos detalhes.

Os relatos das viagens, se bem que aqui aparecem concisos porque outro livro (que não há a venda nos sebos) conta os mínimos detalhes.

O macho da tartaruga chama-se Catipari e é muito malvado. Quando chega o dia dos filhotes saírem dos ovos, ele está na espreita. Se a mãe tartaruga não impede e o faz com extremo heroísmo, o catipari devora todos os filhotes, um a um.

Os índios Caborís, ferozes, brancos de olhos azuis, proveniente da Guiana Holandesa, foram catequisados pelo missionário sergipano, natural de Itabaiana, frei Antônio de Góis. Esse missionário foi quem descobriu o pico da Neblina e por conta de seu zelo e empenho o pico ficou do lado de cá da fronteira.

A palavra moleque vem de “Mulus et équa” do latim significa mulo e égua. Ou filho de uma égua. O latim possui muitas palavras assim formadas pelas iniciais do descritivo, como a palavra cadáver que vem de “caro data vermibus” e Sanctus que vem de “sanguine tintucts”: Santo sempre foi mártir.

(fim)

 

 

 


domingo, 25 de abril de 2021

TEMPO DE TRAVESSIA, Francisco Guimarães Rollemberg

 

TEMPO DE TRAVESSIA, Francisco Guimarães Rollemberg, J. Andrade, 2021, 208p, isbn 978-65-993739-6-1

 



Recebi um presente especial: o novo livro de Francisco Rollemberg, também de memórias, como o que acabo de ler, de outro médico, J Fraga Lima: “Minha passagem pela Vida.”

Mais uma história de vida vitoriosa, de que precisamos para nos alentar nessa pandemia tétrica. No livro, entretanto, Francisco se atém mais a momentos especiais que viveu, a livros que leu, a pessoas/personagens que o marcaram, a atividades públicas que exerceu. Não é ainda o livro cronológico que contará sua vida, passo a passo, na qual tive uma insignificante participação de paciente. Por volta de 1970, eu tinha 25 anos, ele me operou de fimose; operação urgente, imprescindível. Após o serviço feito, no próprio consultório (acho que o prédio do antigo hotel Pálace), ele pegou, com uma pinça, o courinho extirpado e o balançou à frente de meus olhos atônitos. “Quer levar ou dou ao gato?” Vi que sorria. Quando saí do consultório, recomendou: “Cuidado para os pontos não estourarem”. Ria novamente. 

Como controlar, dormindo, a fantasia do sonho erótico? Doutor Francisco teve que refazer os pontos com linha mais forte e a recomendação com mais ênfase.

“Tempo de Travessia” fala de Barreto Fontes, o lendário professor e inventor: o cafezinho batizado com conhaque, os dentes de cemitério, ele e os irmãos apelidados como "cerca" andante (eram todos altos e macérrimos); a “química” para o tesouro do Estado desaparecer...

De Carlos Chagas, o médico cientista... Vítima da inveja, esperou paciente o reconhecimento. Emprestou seu nome à doença que matava silenciosa e ignorada pela academia. O besouro foi desmascarado e contido. Casas de taipa viraram de alvenaria.

De Manoel Armindo Guaraná, outro médico, homem público e intelectual, que se eternizou como autor do “Dicionário Bibliográfico Sergipano”; estilo simples primando pela clareza; pra que mais?

Oswaldo Cruz, médico cientista, parelha e contemporâneo de Carlos Chagas. Luta inaudita para erradicar a febre amarela e malária em um País florestal, o Brasil. 

Walter Cardoso, mais um médico, este imortal da Academia Sergipana de Letras...

Há considerações oportunas sobre a Encíclica de Leão XIII: “Sobre as Coisas Novas” (Rerun Novarun); a questão do trabalhador frente ao capital, a Igreja descobrindo sua função social.

No meio dos médicos, dos cientistas e dos papas, entra Seu Ricardo de Aurelina, gostoso teatro de um momento em Laranjeiras simplória. E o testamento de Judas, resgate de nossos costumes autênticos: “Quedê a madrinha Deodata / como é que a senhora vai? /Nascendo neto aos cardumes / e nada de aparecer pai / e diga que mistério é esse / De onde é que eles saem?”

Tem Zózimo Lima com suas variações em fá sustenido que eu alcancei e li na Gazeta de Sergipe. A poesia do cotidiano que encantava, valia pelo jornal inteiro, sem tirar o valor de ninguém. 

E Murillo Melins, um santo vivo em nosso meio, cujo brilho nos ajuda a brilhar. Conseguiu trazer a boemia para as páginas do impagável “Aracaju Romântica que Vi e Vivi”, porque ele era a própria boemia.

Há uma justa homenagem a Antônio Valença Rollemberg, humilde comerciante das Laranjeiras de antanho, seu Toinho da Farmácia, pai do autor. A dona Cesartina, a primeira farmacêutica formada de Sergipe. A Luiz Antônio Barreto do instituto Tobias Barreto. A Garcia Moreno e seus “Doce Província” e “Cajueiro dos Papagaios”; e a Luiz Garcia, o governador de obras estruturantes e perenes.

Há considerações sobre o poeta do absurdo de Zé Limeira... Sobre a boa poesia de Eunaldo Costa... Como um poeta assim some no passado, tão ligeiro? 

Sobre si, Francisco Rollemberg reproduz a entrevista prestada a revista Somese, onde mostra seus sonhos, seus ideais e suas realizações nos vários segmentos onde atuou.

A segunda parte do livro apresenta um ensaio sobre o admirável Maquiavel, de “O Príncipe”.

A terceira parte mostra, de maneira sucinta, suas realizações como Deputado Federal e Senador, mandatos que exerceu com extremo zelo.

“Tempo de Travessia” é pequeno (206 páginas) mas traz conteúdo com a qualidade própria das grandes obras.

(Aracaju, 25 de abril de 2021, em plena pandemia do Corona Virus. Revisto em agosto de 2023. Por Antônio FJ Saracura).