quarta-feira, 20 de maio de 2020

O ECLIPSE DE UM FAROL, José Lindvaldo Souz


O ECLIPSE DE UM FAROL, José Lindvaldo Souza, sem outras informações




Li “O Eclipse de um Farol” do professor José Lindvaldo Souza e tive boa surpresa. Interessante como o livro chegou às minhas mãos...
O professor mandou-me uma mensagem pelo facebook de que deixara dois livros seus à minha disposição no departamento de história da Ufs.

Por que não perguntou meu endereço ou deixou aqui em casa? A Ufs é no fim do mundo. Talvez nem soubesse que eu moro Aracaju.
Fui buscar, dois dias depois, aproveitando uma reunião que faria com Péricles Andrade, da Editora (sobre a Bienal) lá na Rosa Elze, onde o Campus da Ufs está.

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Tive o primeiro contato com Antônio Lindvaldo, meses antes dessa ida à Ufs, em um painel na Biblioteca Epifâneio Dórea. O professor fazia uma palestra sobre recuperação de memórias e mais outros negócios ligados à nossa história que teima em se perder. Na plateia, havia um grupo de pessoas que parecia ser alunos seus da Universidade, e alunos apaixonados pelo professor e pela matéria; sempre aplaudiam. Eu estava lá por um acidente...
Pelo que me lembro, eu havia ido bater um papo com Pedrinho dos Santos, que habitava um toca no último andar. Pedrinho não chegara ainda, fora ao médico, conforme me informou o guarda da portaria. Fiquei desorientado, zanzei, e, aí, percebi um movimento de gente entrando no grande auditório. Fui investigar...
Um homem alto e bem apessoado estava no tablado ao fundo, temperando a garganta, ajustando o facho de luz de um projetor, cuidando de detalhes para começar algum falatório. Fiquei curioso e não intentei de cair fora; sentei-me para ouvir o que viria daquele desconhecido; e fazer uma horinha na esperança de Pedrinho retornar e eu não perder a viagem. E ele começou...
Percebi logo que ouvia um professor carismático, com real vocação para cativar, até pássaros que passavam voando, que era o meu caso.
Na transcorrer da palestra, o professor (li o folder que circulava no auditório) citou/mostrou um caderno manuscrito que tomara emprestado a idoso morador de Aracaju, de uma dessas periferias humildes que ele visitara em busca do passado. E leu trechos do caderno, revelando relembranças singelas, que me tocaram a alma.

Ao final da palestra, achando que meu livro “Os Tabaréus do Sítio Saracura” teria no professor um leitor digno, me aproximei do bolo de fãs, achei uma brechinha, e dei-lhe um exemplar autografado. Ele me olhou estranhando; e eu disse algo como se meu livro fosse um documento parelha do manuscrito do tal morador. O professor alteou as sobrancelhas, realçando o estranhamento, e segurou o livro com certo pesar displicente. E eu saí roda, sumi de sua vista, achando fizera besteira. O que há de escritor entrão, querendo plantar sua baboseira no meio graúdo?

O tempo passou...

Os livros estavam no escaninho do Departamento de História da Ufs, que demorei a localizar. “O Pulso de Clio” (que eu já comprara, anonimamente, em um lançamento no IHGSE, ao coautor Claudefranklin Monteiro, mas ainda não lera) e “O Elipse de um Farol”, que acabo de ler.
E como sempre faço, o meu exemplar de O Eclipse ficou todo rabiscado com minhas impressões no decorrer da leitura que, a seguir, tento interpretar.

Acho que as “apresentações” e “introduções” prejudicam o suspense, adiam o prazer da leitura ou até a dispensam. A trama pode ser revelada tornando a leitura do corpo principal um detalhamento desinteressante. Quanto mais bem feitos estes preâmbulos, mais podem induzir o leitor a não se enfurnar no livro. Com a roda viva que nos atinge a todos, ler uma orelha, uma contracapa, quanto muito uma apresentação ou uma introdução, é ler demais até. No caso específico deste livro, entretanto, a introdução escrita pelo próprio autor, me encheu de expectativas. Calculei que leria um romance e tanto, no qual seria contada a epopeia do padre José Vivente de Jesus. Eu lá lera alhures sobre ele a sua luta em uma fase crítica de sedimentação da igreja em Sergipe que, finalmente, ganhara um bispo para cuidar do rebanho, saindo um pouco do poder político.

Aprendi que as fontes fragmentadas, deterioradas, são o melhor prato para o historiador. “Selecionar, cruzar, combinar, compor, montar, revelar o detalhes, dar relevância ao secundário, eis o segredo de que a História se vale” (citação de Pesavento, Sandra Jatahy). A célula instiga e, através dela, o corpo pode ser dissecado.

A impressão que tive é que o autor usou Vicente como guia na feitura da didática, demonstrando que os pequenos fiapos esgarçados, e aparentemente imprestáveis, são a melhor matéria prima da história.
Para mim, o primeiro capítulo e mais a introdução esgotaram o assunto...

Os dois personagens, José Vicente de Jesus e o Coronel Sebrão vivem um cenário onde a igreja se romaniza e o estado tenta reter, a qualquer custo, o poder sobre ela. Uma medição de forças, onde os padres quase sempre perdem para os coronéis truculentos. Mas, silenciosamente a igreja vai se impondo, como aqui em Itabaiana, roubou-lhes Moita Bonita e o Saco do Ribeiro, apoiada nas capelas atuantes.

O discurso me pareceu coerente, a menos no julgamento que fez à obra de Vladimir Souza Carvalho, que achei fora de tamanho, lugar e momento. Nos capítulos seguintes, o professor teoriza mais do que narra. Talvez por isso, achei que o texto foi engordados sem necessidade, incorporando obviedades, repetições de passagens já contadas, visando encaixar o ensinamento da ciência, a sua didática que me pareceu esmerada.

Gostei de ter conhecido um pouco mais do padre/cônego Jose Vivente de Jesus, um lagartense que serviu a Itabaiana no rastro de Manoel Baptista Itajahy e que enfrentou com ousadia suicida o portentoso coronel Sebrão. Vladimir Souza Carvalho dedica um capítulo denso (O Conflito de Sebrão com o cônego José Vicente de Jesus) e mais três caxangás (poemas tipo pasquim) tratando do conflito em seu livro “A República Velha em Itabaiana”.

E gostei de ter sido apresentado ao padre intelectual José Gumercindo dos Santos, este filho de Itabaiana, e com todos os pre-requesitos de santo da Igreja, que será um dia ainda.

Aracaju, 01 de setembro de 2013, Antônio FJ Saracura)

Post Scriptum: E o exemplar de “O Eclipse de um Farol” sumiu de minha acanhada biblioteca. Precisei reler alguns pontos agora, em maio de 2020, quando finalmente arrumei tempo de botar a resenha no meu blog “Sobre Livros lidos”. Devo ter emprestado a alguém. Mas não tenho a mínima ideia do quem. Não devo emprestar livro algum.





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