domingo, 10 de janeiro de 2021

TERRA VERMELHA, um filme

 

TERRA VERMELHA, um filme perdido no meio de livros, diretor Marco Bechis, elenco: Leonardo Medeiros e outros, Brasil, 2008.

 

 


Apesar do aviso de que havia legendas no filme, elas não apareceram hora nenhuma. Todas as falas foram em tupi-guarani, que não entendo. Compreendi por suposições, e óbvio, com risco de erro de interpretação.

 E entendi assim:

Índios civilizados, ainda protegidos pela Funai ausente (a não ser nas placas gastas e em burocratas alheios), por conta das condições desfavoráveis da vida, sentem o clamor dos antepassados exigindo o sagrado direito de ir e vir. E o de exigir de volta suas terras, patrimônio natural que, a cada dia, é mais e mais descaracterizado e bloqueado a eles. 

As duas indiazinhas encontradas enforcadas na floresta-mãe (uma nesga apenas ainda respirando o passado), como o maracá silenciado (para se comunicar com o além), como o serviço-escravo oferecido nas fazendas, como a dificuldade cada vez maior em adquirir o alimento, são vozes que acordam o povo morto.

E um grupo pequeno de índios leva a sério estas vozes agoniadas (graças a Deus ainda ficou preservada a fala a seus mortos) migra para as margens de uma mata fechada, ao lado de estrada de alto tráfego. Entretanto, um campo de terra arada interpõe-se, barra-lhe o acesso à mata. O dono da fazenda começara a derrubada. 

Ao perceber o povo estranho abeirando, o fazendeiro destaca um guarda armado, para impedir acesso à sua propriedade. 

Essas e outras cenas mostradas pelo filme são imagens dolorosas da invasão inexorável do progresso (bom em muitos aspectos) e da perda progressiva de um passado glorioso (ruim para os remanescentes do heroico povo dizimado).

Os índios relutam entre receber a esmola do branco (o fazendeiro se aproxima para ver intenções) ou seguir o absurdo sonho de recuperar a terra dos antepassados. 

A civilização branca é inexorável em sua gula, cria atrativos enganadores para dominar: o corpo juvenil da pequena maconheira, o tênis importado, promessas e ameaças, a maldita cachaça...

O acampamento começa a crescer. O fazendeiro se atribula. As tentativas em afastar os índios não surtem efeito. Não pode ceder, mesmo reconhecendo a justeza natural do pretendido por eles. Precisa sustar a ameaça que é pequena ainda. Outros povos mortos se levantarão e virão se juntar ao grupo de índios na beira das estradas.....

E é feito o que foi em todos os tempos. O “direito” do mais forte é abençoado e exercido. A “guerra justa” (outra vez) é perpetrada e a voz do direito silenciada à bala e facão. 

Do outro lado, a esperança de continuar a luta (até quando?) sucumbe ante a força maior.

O suicídio não seria mais adequado, em vista da perda do ideal, da consciência de inutilidade da missão? A corda aperta o pescoço do guerreiro que comandou o sonho.  Talvez a morte seja melhor do que a vida humilhante e sem sentido.

(Aracaju, 07 de dezembro de 2013, Antônio FJ Saracura, recuperada em dezembro de 2021)

 xxx

 

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