quinta-feira, 19 de novembro de 2020

IBIRADIÔ, Gizelda Morais,

 

IBIRADIÔ, Gizelda Morais,Scortecci (2005, 3. Edição),Isbn: 9-788573-728736

 


Até centros meios é um livro lento, pesado. Estive a ponto de largá-lo como já fiz com outros de autores badalados. O português camoniano da história verdadeira (em caracteres normais), invertendo aqui e acolá a ordem normal das frases (como se quisesse rimar decassílabos) não conseguiu me convencer da antiguidade dos acontecidos.

Bastava ter dito (como o foi em algum lugar) que os fatos descritos aconteceram por volta de 1590.

Mas, depois, peguei a embalagem e, agora depois de lido inteiro, considero este “Ibiradiô” um livro indispensável e o recomendo a todo leitor, especialmente, a todo sergipano. Não para se glorificar, mas para se entristecer com a nossa história. Que carnificina, meu Deus! Que valentia suicida de nossos índios? Que sanha assassina dos nojentos portugueses? Pena que não nos coube sequer o direito de tentar impedir, ou lutar e morrer junto como guerreiro de Serigy. Aconteceu muito antes de nascermos.

O que os portugueses fizeram com a dizimação indiscriminada das nossas populações indígenas? Talvez tenham conseguido este Brasil que temos hoje. Por mais que nos esforcemos, por mais que trabalhemos, por mais que o homem simples (indígenas?) se matem em busca do sucesso... um bando de nobres corruptos desmancham, agindo exatamente como seus ancestrais Dias Moreya, Dias de Ávila, Fonseca, Muniz Barreto, Lopes Ulhoa, Fernandes, Gomes, Costa Silveira, Abreu (como cita a autora na página 186). Poderemos nos orgulhar de nossos ancestrais?

O grupinho de pseudo intelectuais fúteis querendo montar um filme (em itálico) não agregou mais do que monotonia ao romance. Seria melhor que fossem eliminados em outra edição. De que adianta para o leitor (no caso eu) o esforço que Cristóvão fará para concluir o drama o mais rápido possível. E também a assertiva de Gaspar: “Deus de ouça”!

Inutilidades.

Mesmo o último diálogo (final do livro) deixa um clima de samba do crioulo doido. Como pode uma história tão densa e séria terminar com um bate papo insensato, demonstrando que tudo não passou de uma tremenda gozação, quando descendentes da elite portuguesa decadente dão um cano homérico na dona da pousada nativa, crédula como seus ancestrais índios.

xxx

Olhando o Brasil atual, a miscelânea de raças, vemos que o africano predomina. Pelo menos, nas regiões pioneiras. Foi escravizado mas resistiu e a cada dia assume seu papel na constituição da nação brasileira. Os índios são poucos (como diz Gizelda pela boca de seus cineastas trapalhões), quase não se vê a marca da raça índia nos sergipanos. Foram foram dizimados pelo gosto assassino dos portugueses que nos colonizaram.

Sobre as grandes questões atuais que se discute no Brasil há uma que agora me parece justíssima: as cotas garantidas para negros e índios nas universidades.

O Brasil branco está se redimindo um pouquinho o grande mal feito a esta parte da nossa nação, negros e índios. É um pedido de desculpas feito pela raça tirana aos massacrados.

Outro dia (dia 17/09/2012) na Roda de Leitura da Epifânio Dórea, tive a honra de, finalmente, encontrar e conversar com Gizelda Moraes. Dei-lhe meus três livros e ele me deu dois dos seus (Absolvo e Condeno e A Procura de Jane, que lerei logo que tenha tempo). Disse-lhe que havia acabado de ler Ibiradiô e que achei cansativo e fútil o romance paralelo (dos cineastas organizando um filme sobre o massacre dos índios de Sergipe). Fui politicamente incorreto. Ela apenas sorriu.

(Antônio Francisco de Jesus, Aracaju 01 de outubro de 2012, revista em novembro de 2020).

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